REVOLUÇÃO EM TAUBATÉ E A AÇÃO PACIFICADORA DE UM BARÃO

 REVOLUÇÃO EM TAUBATÉ E A AÇÃO PACIFICADORA DE UM BARÃO
Texto de Fabiana Pazzine

Não é de hoje que a Constituição Brasileira, a nossa magna carta, dá o que falar. A primeira Constituição foi promulgada em 1824, por D. Pedro I e causou uma grande polêmica, pois havia aqueles que defendiam a sua plena aplicação e outros que defendiam a adoção do absolutismo como a forma ideal de governo 

Abdicação de D. Pedro I. Revista de História da Biblioteca Nacional, nº 39
Abdicação de D. Pedro I. Revista de História da Biblioteca Nacional, nº 39

Em 1831, teve início o Período Regencial, tendo como marco a abdicação de D. Pedro I que deixara no país seu filho D. Pedro II, que na época era uma criança. Neste período, o Brasil viu surtos de separatismo em Pernambuco, Pará, Maranhão e Rio Grande do Sul e podemos dizer que boa parte dos problemas enfrentados neste período se deve ao fato de muitos brasileiros não enxergarem a legitimidade do poder dos regentes.

Dez anos após a abdicação do pai, D. Pedro II, aos 15 anos de idade, assumiu o poder e, o que poderia marcar o fim de uma série de conflitos, já que, a legitimidade do poder de D. Pedro II não poderia ser questionada (sob a justificativa da hereditariedade), acabou inaugurando uma série de problemas de outra natureza: o problema neste momento se dava na luta entre liberais e conservadores que disputavam espaço no cenário político nacional.

D. Pedro II aos 12 anos. Félix Émile Taunay
D. Pedro II aos 12 anos. Félix Émile Taunay

O descontentamento político é explicado por uma série de medidas adotadas pelo imperador (interpretação do Ato Adicional, criação de um Conselho de Estado e uma reforma no Código Penal) que eram entendidas pelos liberais como medidas despóticas que facilitariam a concentração de poder nas mãos dos conservadores.

  • Interpretação do Ato Adicional: os vice-presidentes das províncias não seriam mais eleitos, mas escolhidos pelo Imperador.
  • Criação do Conselho de Estado: que teria um caráter vitalício. Os liberais viam nessa criação um possível reduto para os conservadores.
  • Reforma no Código Penal: centralizava as nomeações do judiciário.
    Fonte: Morse, Richard M. Formação Histórica de São Paulo (de comunidade à metrópole)

Em consequência das medidas propostas pelo governo, Feijó alertava, dizendo que estas leis poderiam levar a Constituição ao deboche. Os liberais expunham também o caráter inconstitucional de tais medidas.

Segundo Richard Morse (1947), os liberais demostravam  arrogância por estarem certos de que, graças a procedimentos eleitorais escusos, dominariam a legislatura próxima. Estavam certos de que o Imperador, plenamente ciente dêsses procedimentos, dissolveria a Câmara, dando margem a uma revolta que poderia ser promovida pelos políticos da ala liberal.

Rafael Tobias de Aguiar. A. Barbieri, Museu Histórico Sorocabano
Rafael Tobias de Aguiar. A. Barbieri, Museu Histórico Sorocabano

Em julho de 1841, Tobias Aguiar, presidente da província de São Paulo, havia sido destituído do cargo em prol de um conservador nascido em Portugal. E, em janeiro de 1842, foi nomeado para o mesmo cargo José da Costa Carvalho (Barão de Monte Alegre), que passou a ser duramente atacado pelo fato de ser baiano, como foi no jornal O Tibiriça, em 1842:

Hino da Baianada

Os Paulistas são cativo
São cativo do baiano,
Que deles podem dispô,
Como sinhô soberano.

 Bahia é cidade
Gaulicéia é grota,
Viva Monte Alegre,
Morra Patriota!!

Iôiô Barão é baiano
É baiano o Inspectô,
É baiano o Juiz do Civre,
E até mesmo o Promotô!

Para acabar com os problemas causados pelos políticos e autoridades da província de São Paulo, o imperador tinha achado prudente colocar no poder agentes que defendessem sua perspectiva política e os paulistas acabaram sendo destituídos de seus cargos em prol dos de origem baiana.

Os liberais, cada vez mais descontentes, organizavam-se e aglutinavam-se em grupos mais ou menos secretos, como a Loja dos Patriarcas Invisíveis, promovendo resistência às medidas impostas pelo Imperador.

O Brasil, 14/07/1842. Acervo Biblioteca Nacional
O Brasil, 14/07/1842. Acervo Biblioteca Nacional

Segundo o jornal “O Brasil” de 14 de julho de 1842, em um artigo sob o título “Crimes da Facção”, Taubaté era caracterizada como o principal foco de rebeldes entre as vilas do norte da província de São Paulo. De acordo com o texto, nesta região o movimento chamava a atenção por sua ferocidade e dizia que a política era menos do que pretexto, para quem o fim único era cevar os ódios contra visinhos, acomettiam fazendas, assassinavam a quantos achavam desapercebidos, incendiavam os paioes e os edifícios dos estabelecimentos. O jornal carioca desqualificava a causa liberal, dizendo que o movimento era uma desculpa para se cometer crimes e promover a desordem. Dizia, ainda, que os favoráveis à causa eram anarquistas e buscavam nas fezes da sociedade as ferramentas para a revolução.

Tobias Aguiar e seus seguidores eram acusados de serem bárbaros tanto em seus atos como nas falas, já que, segundo o mesmo jornal, um dos integrantes do partido conservador havia sido acusado pelos liberais de ter destruído parte de uma de suas fazendas com a finalidade de incriminar seus adversários. “O Brasil” ainda dizia que os atentados (forma como chamavam o movimento liberal de 1842) serviam para os Brasileiros a nunca, nunca, darem ouvidos aos seus apregoados libertadores.

A solução tomada pelo governo para dar fim a este movimento que ameaçava a autoridade do imperador tinha sido chamar aquele que, por conseguir suprimir diversas revoltas ocorridas no Brasil, havia ficado conhecido como “O Pacificador”. O próprio Duque de Caxias, sob as ordens do imperador, é quem teria a obrigação de acabar com a organização de 1842.

O Brasil, 14/07/1842. Acervo Biblioteca Nacional
O Brasil, 14/07/1842. Acervo Biblioteca Nacional

Apesar de em julho de 1842, a região de São Paulo ser considerada pacificada, duas cidades ainda continuavam a dar trabalho para o Império: Taubaté e Pindamonhangaba, que, segundo “O Brasil”, não estão subjeitas ás novas autoridades policiaes, ainda o norte da província carece do emprego da força, ainda há que organisar uma policia militar activa que inpeça que os rebeldes continuem salteadores. Para essa tarefa havia sido chamado José Thomas Henriques. Para finalizar a matéria, o jornal desejava boa sorte ao Duque de Caxias que deixava São Paulo para dar fim ao conflito nas Minas Gerais e a José Thomas Henriques que tinha a tarefa de terminar o trabalho de Caxias em São Paulo. O Publicador Maranhense, reiterava a notícia de “O Brasil” afirmando que na villa de

Pindamonhangaba, cidade de Taubaté e mais alguns pontos, é decidida a tendencia para a rebelião. Pessoas da maior influencia n’essas paragens trabalham com furor para isso; muitas d’ellas comprometteram-se com o coronel Raphael Tobias de Aguiar […]. Em 2 de junho, o Barão de Monte Alegre, por meio do jornal “Publicador Maranhense”, dizia que a capital estava em estado de completa defesa, mas que a primeira comarca, que confina com a Provincia do Rio de janeiro tem me dado algum cuidado pela agitação que reina na cidade de Taubaté: são por ora insultos e violências sem fim declarado, e sem uma pronunciação formal pela rebelião, mas que breve rematarião nisso a não ser a aproximação do batalhão dos fuzileiros.

O batalhão de fuzileiros tinha marchado de São Sebastião para Paraybuna que apesar de terem incendiado uma das pontes desta vila (hoje cidade)  a ocupação havia sido feita sem a menor resistência. E por ordem do então Barão de Caxias (que só mais tarde seria duque) mais cem soldados iriam incorporar o batalhão para fazerem a ocupação de Taubaté.

Duque de Caxias
Duque de Caxias

E em 26 de Julho de 1842, o “Publicador Maranhense” trazia a notícia da restauração de Taubaté, que era o último reduto dos liberais na província de São Paulo, falando sobre a tomada da cidade por parte dos conservadores e que nesta ocasião alguns liberais deixaram a cidade, enquanto outros assassinaram dois presos que se encontravam na cadeia da cidade.

No dia 17 de julho havia sido mandado, para tomar posse do cargo em Taubaté, um novo juiz, mas, conforme o “Publicador Maranhense”, sob a justificativa da falta de vereadores a Câmara Municipal negou a posse ao novo juiz e o jornal carioca “O Brasil” denominava Taubaté de anarquista. E, apesar de ter sido considerada pacificada, segundo o jornal do Maranhão, Taubaté ainda inspirava cuidados, pois, segundo uma fonte não declarada, cerca de 400 insurgentes haviam se reunido em Taubaté, marcharam pela serra de Minas, e vão sahir na de Itajubá, para sahirem em Lorena e reunirem-se nos Silveiras, para seguirem para Arêas.

Apesar das tentativas de se reorganizar o movimento, a soberania do imperador estava garantida pela ação pacificadora e dois anos depois todos que tinham participado da Revolução tinham sido anistiados. Em 1846, D. Pedro viajou pelas províncias do sul, Tobias Aguiar, que havia ficado conhecido como um dos líderes do movimento participaria da comissão de recepção ao imperador. Para selar o clima de cordialidade, D. Pedro distribuiu títulos honoríficos, dezenas deles a ex-revolucionários (MORSE, 1947).

Referências

O Brasil, edições de 1842
Publicador Maranhense, edições de 1842
MORSE, Richard M. Formação Histórica de São Paulo (de comunidade à metrópole), 1947.

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Fabiana Cabral Pazzine é professora de história. Pesquisadora de História Cultural e Social.

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