Taubaté nos anos 50 a Capital do Vale: o novo e o velho em disputa

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giovanna3

Ao alcançar seus 367 anos a cidade de Taubaté nem sempre foi a mesma. Passou por vários momentos de expansão e de transformação ao longo de mais de 3 séculos. Mãe de várias outras cidades, Taubaté não esconde em sua história seus problemas e principalmente seus conflitos.

Vale lembrar que a imprensa, desde 1861, sempre esteve presente nas discussões a cerca dos conflitos, seja favorecendo alguns ou acusando outros. O fato é que temos através dos jornais dos anos 50, um importante diálogo entre a principal disputa do período: e velho versus o novo. O que a diferenciou para sempre da atual capital do Vale, São José dos Campos.

Taubaté nos anos 50 a Capital do Vale: o novo e o velho em disputa

Trecho de anúncio publicado no jornal A Voz do Vale do Paraíba, de 11 de julho de 1948
Trecho de anúncio publicado no jornal A Voz do Vale do Paraíba, de 11 de julho de 1948

No início da década de 1950, o Estado de São Paulo se tornou o centro industrial do país e permitiu que as cidades pertencentes ao estado no eixo Rio – São Paulo, por onde “corria o progresso” se urbanizassem e se organizassem rumo a modernização conservadora, que como afirma Gonçalves

A idéia de trazer uma urbanista de renome nacional para a cidade, para divulgar suas idéias, consideradas naquele momento modernizantes, do ponto de vista da racionalização do espaço urbano, revela uma elite que oscila entre os impulsos da novidade trazida pelos ventos do americanismo e a manutenção da ordem e dos ‘bons costumes’ (GONÇALVES, 2003, p. 42).

      Todo o contexto internacional se fazia presente não como realidade a ser vivida em Taubaté, mas, que pelas ondas da Rádio Difusora e dos jornais que circulavam na cidade, os conflitos da década anterior que animara a população para o início de um novo tempo após a Segunda Guerra Mundial.

Felix Guisard Filho
Felix Guisard Filho

 […] afirmando ainda, que 1950 apresenta-se como Ano Santo viria trazer paz e progresso, reanimando o mundo abalado pela guerra, cujas conseqüências foram funestas para a humanidade. […] minorando os sofrimentos, trazendo novas esperanças para realização de grandes coisas que não se realizaram nos anos anteriores (Ata da Câmara Municipal de Taubaté – 24.ª Sessão Extraordinária, 01 de Janeiro de 1950, p. 2).

O vereador Dr. Felix Guisard Filho iniciou os trabalhos na Câmara Municipal de Taubaté em janeiro de 1950 sob esse discurso. Em todo o país era esperado com entusiasmo o novo decênio, pois aos países abalados pela força, dimensão e ruptura brusca em todos os níveis sociais que alcançara a Segunda grande guerra (1939-1945), viera um clima de esperança, de otimismo, de reconstrução. Quando dito reconstrução lia-se nos campo econômico, social, político, cultural e educacional, como forma de recuperar a fase de crise com a explosão da guerra na Europa.

O mundo após 1950 não seria o mesmo, e conseqüentemente Taubaté enquanto posição geográfica de interior do estado, não permaneceu a mesma. A essa transformação sofrida pela cidade, que então recebia o nome de Capital do Vale, como visto em um artigo do jornalista Oswaldo Barbosa Guisard ao Jornal A Tribuna de 1952, fez com que a cidade se urbanizasse em função da modernização, mas mantendo seu caráter conservador. Neste mesmo artigo o jornalista sustenta a crítica de que a pesar de todo o progresso Taubaté ainda se encontrava em condições precárias que precisariam de ajustes frente às outras cidades vale paraibanas como São José dos Campos.

Oswaldo Barbosa Guisard, um dos acionistas do Taubateano S/A
Oswaldo Barbosa Guisard

  Não é menos certo também que Taubaté, de ha um bom lapso de tempo, vem lutando tenazmente com o estigma retrogrado, tremendo, de péssimas administrações municipais. Tem o seu povo sido, nesse particular, de marcante infelicidade. […] E, quer nos parecer que é possível, talvez mesmo em um futuro não afastado, a concretização do sonho do correspondente joséense (SIC). […] Todavia por ora, ainda não. Mercê da sua idade, da sua iniciativa particular e de outros fatores, Taubaté, talvez envelhecido, talvez fatigado, entravado em parte no seu desenvolvimento, quer pelo seu município ou pela sua séde (SIC), ainda é o vanguardeiro na projeção das coletividades valeparaibanas. É o maior (A Tribuna, 06 de Novembro de 1952, p. 2).

 Apesar da modernização ocorrida no vale do Paraíba, especialmente em Taubaté, a década de 50 era marcada também pelo forte apelo conservador dos meios de comunicação como a Rádio, a imprensa taubateana e uma parcela da classe média agrária, na oposição à industrialização crescente. Nos anos 50 o embate que permeou as relações sócio-urbanas em Taubaté correu no sentido da Modernização versus Conservadorismo.

Com a posição ocupada pela cidade no “curso do capital”, industrial, promovendo a urbanização moderna[1], como característica do Estado de São Paulo era de interesse também dos setores sociais inclusive a Igreja Católica em manter sua hegemonia e participação nas decisões da cidade.

     Em tese, a cidade inicia seu crescimento com a promoção do êxodo rural, iniciado anos antes, a concentração populacional no centro urbano e as respectivas políticas de expansão da população para a periferia da cidade, iniciando o processo de abairramento, e conseqüentemente exigindo maior atenção do poder público.

 Tabela 1 – População de Taubaté nas décadas 40, 50 e 60

 

1940

1950

1960

Taubaté

28.309

35.960

65.911

Fonte: MÜLLER, 1969, p. 69.

       A tabela 1 demonstra a evolução populacional urbana de Taubaté em vinte anos. Praticamente entre 1950 e 1960, a população quase duplica, pois a região passa a ser mais valorizada no centro industrial, principalmente com a vinda de empresas multinacionais para região, promovendo maior concentração urbana na cidade, fator esse que não excluí a possibilidade de conflitos como roubos, malandragem e atentados ao pudor. A concentração urbana não acompanhou a demanda industrial.

     Taubaté nos anos anteriores à década de 1950 havia iniciado seu processo de crescimento urbano fomentado pelo crescimento do comércio, nascimento das primeiras indústrias locais e do processo de abairramento em função destas que como a C.T.I. [2] e a Corozita[3], que fundaram vilas operárias contribuindo com o desenvolvimento da concentração populacional, migrando do campo para o centro urbano. Com isso, iniciou-se um novo diálogo como afirma Gonçalves (2003) entre a indústria e a escola, que fora juntamente com as vilas operárias destinadas a formação intelectual e formativa do operário

 […] O fato merece destaque por sua relevância social, econômica e cultural: em uma área urbana de ocupação proletária, uma indústria parte de seus esforços no campo da educação e da cultura. O diálogo indústria-escola, para além do determinismo econômico, possibilita-nos trabalhar com a tese da inculcação de valores baseados na nova lógica do capital, em curso na cidade (GONÇALVES, 2003, p. 32).

      Esse crescimento só é possível após a iniciação do processo de industrialização permitido após os anos 30, no qual a tabela a seguir demonstra o crescimento populacional urbano frente à população total do município.

Tabela 2 – Taubaté, População, Taxa de Urbanização, População Ocupada na Indústria e Número de Residências

 

Ano

População

Taxa Urbana

Ocupação Industrial

Residências

 

Total

Urbana

%

Total

Têxtil

Total

Urbana

Rural

1900

36.723

1920

45.445

1934

36.564

21.840

59,7

3.502

1940

40.970

28.309

69,0

1950

52.997

35.960

67,9

1960

78.744

65.911

83,7

6.047

3.484

1970

110.706

100.031

  90,3

6.941

    2.513

1980

169.265

161.411

  95,3

35.188

34.188

1.000

Fonte: FIBGE. Censos demográficos. In: RICCI, 2002, p. 3.

Rua no centro de São José dos Campos

     Com os dados da tabela 2, pode-se perceber que a partir dos anos 50 há um crescimento significativo da população urbana, que consequentemente representa uma mudança na mentalidade do taubateano, que acompanhando o curso da capital do Estado, guardada as devidas proporções, é inserido na lógica industrial do desenvolvimentismo, localizando-se como intermediária no crescimento da região sudeste.

Taubaté se encontrava no eixo Rio- São Paulo o que favoreceu o processo de urbanização e aperfeiçoamento industrial, que eram propostas pelas novas diretrizes políticas nacionais que afetaram em números a organização desse município no correspondente período.

Mas, por outro lado, o projeto de modernização conservadora defendido pela aliança entre a Igreja e alguns profissionais da classe média urbana, não asseguraram a posição da cidade de Capital do Vale, perdendo para a vizinha São José dos Campos, que inicia seu processo de urbanização e desenvolvimento industrial, liderando nas décadas seguintes a produção em escala nacional e internacional de suas indústrias.


[1] Conceito utilizado por MÜLLER em O Fato Urbano na Bacia do Rio Paraíba – São Paulo, 1969, p.67.

[2] Companhia Taubaté Industrial (1891 – 1984), criada pelo industrial Félix Guisard, que produzia têxteis que eram vendidos para países como Inglaterra, México, além do comércio local.

[3]  Sobre a Fábrica de Botões Corozita, conferir o terceiro capítulo da presente monografia.

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Giovanna Louise Nunes é professora de história

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