Inezita Barroso

 Inezita Barroso

Texto de Renato Teixeira publicado na edição 680 do Jornal Contato .

(Inezita faleceu em março de 2015)

A eloqüência de sua passagem pela terra, permanecerá. Discreta e talentosa, Inezita Barroso soube como ninguém perpetuar nossas tradições desenhando no ar um pacto sonoro comparável a um painel de Portinari com as cores sutis do Di Cavalcanti e os movimentos graciosos da obra de Justino.

O que fica realmente dessa grande artista foram as batalhas travadas ao longo da vida e os resultados conquistados. Manteve viva durante décadas o espírito do caipirismo brasileiro, que passou por um verdadeiro corredor polonês criado por convergências musicais de alto calibre como a bossa nova, a jovem guarda e o rock. O tropicalismo de alguma maneira foi mais generoso com a cultura caipira; Rita Lee, Tom Zé e o maestro Rogério Duprat perceberam essa tendência mesmo porque algumas das referências mais significativas do movimento, como Mário de Andrade, viam essa cultura como uma questão irrevogável da nossa arte popular.

Lança seu primeiro 78 rpm comercial (Gravadora RCA Victor) com “Moda de Pinga” (folclore paulista) e “Ronda” (Paulo Vanzolini)
Lança seu primeiro 78 rpm comercial (Gravadora RCA Victor) com “Moda de Pinga” (folclore paulista) e “Ronda” (Paulo Vanzolini)

Inezita não cedeu um momento sequer. Radicalizou suas posturas e foi à luta. Viola Minha Viola se transformou num baluarte de suas convicções. Exibido por uma rede estatal, o programa não era avaliado pelos institutos de pesquisa, mas sua audiência, enorme. Em alguns lugares do Brasil, pessoas se locomoviam para longas distâncias até onde o sinal podia ser captado, só para assistirem o programa. Bethânia assistia a todos e uma vez me ligou para tecer comentários apaixonados.

Imagem:  tvcultura.cmais.com.br
Imagem: tvcultura.cmais.com.br

Os artistas que participavam da programação eram, na grande maioria, duplas originais, fiéis aos conceitos que alicerçaram a história do gênero. Eu, Almir e Sérgio Reis éramos sempre convidados porque a rainha via em nossos trabalhos uma sequência coerente daquilo que ela sempre acreditou.

Inezita nunca foi conservadora. Culta e linda, era comovente vê-la abraçada ao violão de um jeito que só ela sabia fazer. Voz possante, dicção perfeita, foi mostrando para todo o povo simples seu próprio rosto e suas virtudes estéticas. Deixou claro que por mais que as culturas de outras terras tenham trânsito livre nos nossos meios de comunicação, a nossa é a única que fala como a gente e tem as nossas verdadeiras cores.

Lançamento do LP “Clássicos da Música Caipira – Volume 2” (Gravadora Copacabana). imagem:  http://tvcultura.cmais.com.br/inezitabarroso
Lançamento do LP “Clássicos da Música Caipira – Volume 2” (Gravadora Copacabana). imagem: http://tvcultura.cmais.com.br/inezitabarroso

Com certeza sua missão não acaba aqui, porque o legado não acaba. Outros artistas virão e, por mais que o gênero sofra mutações, a obra de Inezita estará sempre nos balizando. Pediu que o programa acabasse quando ela partisse e eu vejo nesse gesto uma sinalização para que avancemos em direção ao futuro com a certeza de que a música caipira sobreviverá sem ela. Assim é construída a história de um povo, com personagens e fatos. Inezita passou por aqui e vai deixar saudade.

 

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2 Comments

  • Quando criança, Inezita sempre esteve presente em minha casa na voz da minha mãe. Ganhou um espaço carinhoso em nossos corações. Belo texto, Renato.

  • Quando criança, Inezita sempre esteve presente em minha casa na voz da minha mãe. Ganhou um espaço carinhoso em nossos corações. Belo texto, Renato.

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