A nova casa
Por Celio Moreira
Foi numa ensolarada manhã do verão de 1935 que saímos da velha casa da Pedro Costa, para ver a que papai pretendia comprar na Rua Barão da Pedra Negra. Éramos três irmãos; Cid, com sete anos, ia um pouco mais à frente com papai; Céa, com cinco e eu, o caçula, com três, não desgrudávamos da mão de mamãe. Recordo como se fosse hoje; a gente passando pelo Largo do Rosário, depois pelo antigo prédio da Prefeitura que hoje abriga as modernas instalações da nossa Difusora. Ganhamos a Barão e seguimos caminhando pela calçada. Nossa curiosidade aumentava em proporção cada vez maior à distância a ser percorrida até o final da rua, onde estava nosso objetivo. Quando chegamos, um senhor veio ao encontro de papai e disse:
– Aqui estão as chaves, seu Isauro. Acho que dona Elza e as crianças vão gostar!
Enquanto papai conversava com o homem das chaves, entramos apressadamente, ávidos prá conhecer a nova morada, o futuro ninho!… Salas de visita e de jantar, três quartos, sendo um nos fundos, banheiro, copa e cozinha com fogão à lenha, bom quintal. Construção nova, cheirando à tinta e com a garantia da Companhia Predial de Taubaté, principal construtora da cidade, estabelecida na 4 de Março, onde está hoje plantada uma Faculdade.
15 contos de reis, pagos rigorosamente em dia, ao longo de 10 anos. Muitas vezes fui à Companhia para quitar a mensalidade. Lembro que papai me entregava uma caderneta onde era anotado o pagamento e uma nota de 100 mil Réis.(acho que era o padrão monetário da época). Muito dinheiro para um menino carregar, mas a cidade era calma. Não havia, portanto, nenhum perigo para os seus cidadãos. Em noites mais quentes era comum a gente dormir tranquilamente com as janelas abertas. Bons tempos!… Morar ali, em casa própria, foi muito significativo. Sinal de que as coisas andavam bem para o velho em seu trabalho no Centro Recreativo, um bem freqüentado clube da Rio Branco que o progresso não esperou muito para… demolir. E em nossa rua de chão batido o silêncio, vez por outra, era quebrado pelo barulho de uma… carroça. Automóvel?… Um Fordéco, raramente, dava o ar da graça, como se tivesse escapado dos filmes de Chaplin.
Então, podíamos jogar futebol de manhã e à tarde sem problema! O calçamento, recebido com alegria pelos moradores, só aconteceu durante a 2ª. Guerra Mundial e nós assistimos a colocação do primeiro ao último paralelepípedo. Uma festa!…E uma dureza pronunciar o nome da pedra sem dar um nó na língua!…
Bem, em breve fomos conhecendo a vizinhança: Os Ribas, os Zamith, os Pereira, os Testa, os Aguiar, os
Queridos, os Mattos, sem contar a garotada do Asilo São Vicente de Paulo, com Didi, Madruga, Augusto…
Tempo de não pensar em nada, senão percorrer os pomares da redondeza, chupar as deliciosas mangas da Chácara do Visconde e brincar, lá mesmo, naquela armação de concreto que os meninos chamavam
“O Poço de Lobato”.
[box style=’info’]Celio Moreira
conhecido também como O Sombra, do Jornal de Vanguarda, é um dos grandes profissionais de comunicação da história do jornalismo nacional.
[/box]
5 Comments
Mais uma deliciosa crônica de Celio Moreira, revivendo Taubaté , rescendendo e revigorando nossa memória coletiva. parabéns Almanaque Urupês. Obrigado pelo crédito na foto.
Mais uma deliciosa crônica de Celio Moreira, revivendo Taubaté , reascendendo e revigorando nossa memória coletiva. parabéns Almanaque Urupês. Obrigado pelo crédito na foto.
Narrativa com cheiro e sabor.História de vida, contada de forma tão lírica que nos dá saudade de um tempo bucólico, que tanto faz falta nestes tempos modernos, sem tempo para apreciar as coisas simples the vida…
[…] http://www.almanaqueurupes.com.br/testedomau/wordpress//?p=6144 […]
Adorei!!
Comments are closed.