Wilson Silva, um morto que editava jornais
Para ditadura, taubateano simulou o próprio desaparecimento, estava vivo e editando um jornal comunista
O taubateano Wilson Silva desapareceu em 22 de março de 1974. Sabe-se que nos porões da ditadura, ele e sua esposa Ana Kucinsci foram torturados, assassinados e reduzidos à cinzas. Porém, para o Ministério do Exército, a história era outra: Wilson simulou o próprio desaparecimento para incriminar injustamente o Estado.
É assim que documentos divulgados pelo Arquivo do Estado de São Paulo e pela Comissão da Verdade registram as primeiras versões oficiais sobre o desaparecimento de Wilson Silva.
“Há subversivos cujos desaparecimentos são imputados aos Órgãos de Segurança, os quais permanecem vivos, na clandestinidade. Pode-se supor que seja um despistamento para motivar o registro do desaparecimento e assim diminuir ou cessar a busca dos citados”, registra o documento confidencial do Ministério do Exército de 8 de outubro de 1974.
O documento interno foi elaborado em resposta a questionamentos levantados pelo jornal Voz Operária, que pertencia ao PCB, que cobrava das autoridades o paradeiro de Wilson Silva e de outras pessoas desaparecidas. Aproveitando o fato do Voz Operária ter um Wilson Silva entre seus articulistas, o texto oficial insinuava que o desaparecimento do taubateano não passava de uma manobra subversiva.
“Sugere-se ao CIE, que difunda aos demais Órgãos de Informações que as constantes acusações de desaparecimento de pessoas, pode bem ser encarado como manobra do inimigo, visando não só a diminuição das buscas como também a acusação aos Órgãos de Segurança como responsáveis pelos “desaparecimentos” de pessoas procuradas”.
O CIE, citado na nota, era o Centro de Informação do Exercito, serviço de inteligência da governo responsável por grande parte da repressão durante a ditadura militar.
Em 6 de março de 1975, pressionado pela imprensa, principalmente a estrangeira e por grupos de defesa dos direitos humanos, o Ministro da Justiça Armando Falcão foi obrigado a divulgar informações oficiais sobre 23 pessoas “apontadas como desaparecidas”.
Segundo a insólita nota oficial, Wilson Silva era “redator do jornal comunista “Voz Operária. Assinou artigos publicados nas edições de agosto e setembro de 1974(…).
Dedicava-se, portanto à prática de atividades subversivas clandestinas, na época em que é apontado como desaparecido”. Estava vivo, portanto.
Só em 1993, relatório do Ministério da Marinha, enviado ao então Ministro da Justiça, Maurício Correa, confirmou que Wilson Silva “foi preso em São Paulo a 22/04/1974, e dado como desaparecido desde então”.
Para saber mais:
Uma monumental realização que disponibiliza cerca de 900 mil páginas digitalizadas de 710 processos julgados pelo Superior Tribunal Militar durante o regime militar.
Livro-relatório que registra e divulga o trabalho realizado pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) – instituída pela Lei nº 9.140/95, de dezembro de 1995, ao longo de 11 anos. O caso Wilson Silva/Ana Rosa Kucinsk Silva esta na página 380.
Livro de Bernardo Kucinski sobre ditadura chama a atenção dos alemães
A busca por Ana Rosa Kucinsk compõe o quadro narrativo de “K.”, do jornalista, cientista político e professor aposentado da USP Bernardo Kucinski, atualmente considerado uma importante voz para o reconhecimento e memória dos desaparecidos políticos durante o regime militar.
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