A Visão do Inferno
Cinquenta e três anos decorridos da maior ocorrência já registrada na história da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, ainda estão presentes em nossa memória os momentos de angústia e de desespero que se desenvolveram naquele dia. Foi um incêndio de proporções gigantescas.
Por Gilberto da Costa Ferreira
Era o crepúsculo do dia 14 de agosto de 1961, uma segunda feira seguinte ao Dia dos Pais e em pleno inverno brasileiro. Naquele dia, encontrando-me na esquina do Ginásio do Estado, o sempre querido Estadão, visualizei uma gigantesca fumaça que surgia nos céus de Taubaté como que anunciando uma iminente tragédia. Eram aproximadamente 17h40. Momentos depois, aquela fumaça de proporção jamais vista logo seria notícia em todos os lugares da bucólica Taubaté. Policiais do 5º Batalhão de Caçadores, atual 5º BPM/I que deixavam seus serviços naquele momento, policiais de folga naquele dia, bombeiros da Willys Overland e muitos abnegados pela causa pública acorreram ao local e se apresentaram para ajudar no que fosse possível. O tirocínio policial do Sargento Edson Lopes Pestana, Comandante da Guarda do Presídio, em adotar medidas urgentes como a de não entrar com sua guarnição no pátio interno, foi de fundamental importância para que não ocorresse a fuga em massa, bem como evitado o extermínio de toda sua guarnição. Ficou do lado de fora com sua tropa cercando o Presídio e aguardando reforço policial. Atitude perfeitamente entendida, pois, era estratégia dos amotinados que com a entrada da guarnição, sensibilizada pelo desespero e sofrimento dos presos para abertura dos pavilhões incendiados, todos os militares fossem mortos. Entretanto, com a chegada de reforços foi possível adentrar ao interior do presídio e constatar que o Pavilhão Alcântara Machado estava totalmente em chamas e com cinquenta e dois detentos em estado desesperador e sem condições de fuga, pois, haviam colocado fogo nos colchões na entrada da cela.
Diante de tal quadro o Major Paulo Vianna determinou uma abertura na parede daquele Pavilhão. O Soldado Brasil Natalino imediatamente tentou com outros policiais colocar em movimento um trator existente nas imediações, entretanto, o motor não funcionou. De maneira resoluta, o soldado Natalino e o guarda de presídio Rubens de Oliveira, com o auxílio de picaretas iniciaram abrir um buraco na parede, a qual, da largura de um tijolo e meio e construída por argamassa de cimento e areia, tornara-se quase impossível sua demolição parcial. Mas, determinados pelo cumprimento do dever e até seu esgotamento físico por completo, conseguiram seus intentos revezando-se, e, contando com a participação de outros policiais, lograram êxito em seus objetivos. Imediatamente, os policiais, Cabo Acidino e Soldado Milton Ribeiro adentraram naquele Pavilhão, tidos pelos presos que se salvaram como “A Visão do Inferno”.
Dos cinquenta e dois detentos que ali se encontravam, quarenta vieram a falecer no local e dois, posteriormente, faleceriam no hospital Santa Isabel, perfazendo um total de 42 vítimas fatais. Os trabalhos para a identificação dos cadáveres através das arcadas dentárias foram realizados pelo Dr. Nivaldo Zollner, que prontamente se apresentou como voluntário. Diversos policiais do 5º Batalhão se apresentaram para o cumprimento de tão árdua missão, entretanto, alguns se sobressaíram, como os Sargentos Edson Lopes Pestana e Florival Pimentel de Araújo, Cabos Acidino dos Santos e Wilson Estevan Vicente, e, os Soldados Milton Ribeiro, Brasil Natalino, José Nadir Pereira e João Felipe Bosco. Há de se destacar a eficiente e pronta intervenção do Sargento Edson Lopes Pestana e do Soldado João Felipe Bosco, pois, ao irromper do incêndio, atiraram bombas de efeito moral à galeria de entrada para os pavilhões, impedindo dessa maneira, a fuga em massa. Foi uma medida de resultados gigantescos até a chegada do reforço do Batalhão. O Cabo Acidino dos Santos e o Soldado Milton Ribeiro, foram promovidos por Ato de Bravura respectivamente a 3º Sargento e a Cabo.
Ao final da tragédia, os detentos Agenor Rebelo, Alcides Alves, Altino Leite, Álvaro Nascimento, Antonio dos Santos, Ariovaldo Rodrigues dos Santos, Benedito Antonio, Benedito dos Santos, Carlos de Oliveira, Clemente Caruso, Gênio Antonio dos Santos, Djalma Batista de Oliveira, Geraldo Antonio de Oliveira, Geraldo de Souza, Geraldo Francisco de Oliveira, Gilberto Guedes da Silva, Irineu José da Silva, João Chaves de Oliveira Filho, José de Melo, José Filizola, José Francisco de Oliveira, José Nascimento, José Nei Santana, José Ramos da Silva, José Ribeiro da Silva, Juventil Barbosa, Luís de Andrade, Manuel Machado, Mario dos Santos, Mário Tang, Maximiano Belo Filho, Osvaldo Giglioti, Osvaldo Soares, Paulo Pinto Ramalho, Pedro Rodrigues dos Santos, Sérgio Alves, Silvino Gabriel da Silva, Valdemar de Souza Conceição ou Antonio Martins, Valdomiro de Souza Filho, Vicente de Paula Gutierrez, estavam mortos.
Os líderes da rebelião Ambrósio Caetano do Prado, Alcides Teófilo (Meia-Noite), Roberto Naves Romeu, Reinaldo Soares (Alemão), Benedito de Paula (Caveira) e Anorelino Soares (Capitão Sujeira), eram egressos do Presídio da Ilha Anchieta e foram transferidos para a Penitenciária de São Paulo. Toda a história sobre o motim incendiário da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté está exposta no Memorial General Salgado do Quinto Batalhão de Polícia Militar do Interior.
PROFº GILBERTO DA COSTA FERREIRA – HISTORIADOR, PESQUISADOR, ESCRITOR E COORDENADOR TÉCNICO DO MEMORIAL GENERAL JÚLIO MARCONDES SALGADO
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Nós filhos de Milton Ribeiro vivenciamos o periodo de stress, e muita tristeza.
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