Um pouco da velha festa do Tremembé

 Um pouco da velha festa do Tremembé

Na minha infância a festa de Tremembé era um encanto. De 15 dias antes e mesmo um mês e mais, numerosas famílias deixavam a nossa cidade, e iam para a “Capela” esperar a festa do Senhor Bom Jesus de Tremembé, que culminava no dia 6 de agosto. A condução para as famílias mais abastadas eram os troles, onde misturados aos passageiros ia todo um museu doméstico: Roupas em grandes pacotes, malas, embrulhos, colher de pau, chocolateira, vassouras, sapatos… uma bagunça parecendo mais uma mudança de cidades por um grupo de saltimbancos. A esse tempo já começavam a ser armadas as barraquinhas, sendo que as mais importantes, paradoxalmente eram as prosaicas “barraquinhas do jaburu” onde havia uma pequena roleta de seis divisões e mais as da “estrela” e da “lua” e que a gente jogava um tostão para ganhar cinco tostões ou quinhentos réis ou seja cinco vezes a aposta e também a do dado, marcando no pano oleado com níquel da aposta, o jogo do “tostão” – quinhentos réis”. Isso acontecia na praça que depois com a vinda da Estrada de Ferro passou a se denominar Praça Paulo de Frontin.

Mas, voltemos às condições de que se serviam os festeiros, devotos e jogadores que não perdiam dias e nem lances da festa do Senhor Bom Jesus. Os “troles diligências” passavam abarrotados, por grupos de pessoas a pé que aumentavam na véspera e no dia 6 de agosto. Era a conhecida turma do “João Guedes”, como eram apelidados os pedestres. Tive uma tia, “Plautila”, que gostava bastante de se reunir, levando também crianças em bandos álacres para nossas excursões. A molecada levava estilingues e não perdia tempo quando avistava uma rolinha, um sanhaço, uma corruíra, enfim, um bichinho qualquer voador. Da nossa turma, da garotada da família, a maior, a indiscutível autoridade no estilingue era o Zé Augusto, hoje um respeitável vovô, comerciante e industrial conceituado e culto, chefe de ilustrada família.

Detalhe da Catedral do Bom Jesus em Tremembé.

Além das conduções para Tremembé de que falamos havia o chamado “bondinho” de Tremembé. De “bonde” nada tinha, parece que tendo herdado esse qualificativo do desaparecido “bonde” puxado a burros, o “bonde” do João Mourão em Taubaté, que ia da estação pela rua “das Palmeiras” ao centro (Largo da Matriz), e passava por mais outras ruas, num percurso circular. Um tipo de diligência do “far-west”.

O “bondinho” de Tremembé, era na realidade um trenzinho, bitola de 60 cts. movido a lenha, soltando fagulhas como um “boitatá”, semelhando a um comboio infantil da “Disneylândia”. O maquinista era um pequeno cidadão, magrinho, encasacado num macacão de zuarte, meio desbotado como essas calças “pão duro” que muitas mocinhas vão apagando com “Q. Boa”. Um bonezinho azul de bico duro. No bolso de trás, uma garrafinha de café. Não havia ainda a garrafa térmica.

Os trilhos em péssima conservação e dificilmente o trenzinho chegava incólume, sem um descarrilamento.

E quando descarrilava, todo mundo descia e o maquinista apelava para a “força total dos músculos dos passageiros “para repôr a maravilha ferroviária nos trilhos. Uma delícia viajar nos trens do maquinista-foguista-graxeiro “Tico Molitor”.

Era o seu exótico apelido: E ambos bem se casavam, condução e condutor.

[box style=’info’] Emílio Amadei Beringhs
emilioDesde menino foi funcionário da CTI.

Atuou por mais de 50 anos no jornalismo taubateano, descreveu com maestria o cotidiano taubateano. Integrou o Instituto Geográfico de São Paulo. Foi um dos pioneiros do rádio amadorismo no Vale.
Na radiodifusão convencional, foi responsável, junto com Alberto Guisard, pela pioneira Rádio Bandeirantes.
Em 1941, foi co-fundador da Rádio Difusora de Taubaté. Foi sócio fundador do Aero-Clube de Taubaté.
Em 1967, escreve o primeiro volume do obrigatório livro Conversando com a Saudade, descrito por muitos como pedaços da alma de Taubaté. É, também, de sua autoria, a bandeira de Taubaté[/box]

almanaqueurupes

1 Comment

  • Adorei essa história do 'bondinho' de Tremembé!

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