Todo grande homem começa no quintal da própria casa
Texto de Renato Teixeira
(Publicado originalmente no Jornal Contato)
Vigésimo segundo andar do hotel. Lá embaixo, Ribeirão Preto se espalha até as serras suaves que a contornam. Depois, é tudo céu azul e distâncias que nos dão a certeza de que estamos, sim, no meio do sertão.
Ligo para minha mãe em Ubatuba.
– Estou em Ribeirão!
– Nossa… acho Ribeirão a cidade mais bonita e espetacular que conheço!
Exagero de mamãe à parte, eu emendo em seguida dizendo que “depois de Taubaté, pode até ser”.
Ser taubateano viajante como eu, é ter consciência que, até 1900, 80 % das cidades brasileiras haviam sido fundadas por nossos ancestrais. Mesmo que esses ancestrais fossem os bandeirantes trogloditas que seguiam impulsos sanguinários em busca de interesses indiscutivelmente discutíveis. Aliás, Ribeirão Preto é uma exceção. Sua origem não tem vínculos com os bandeirantes. A cidade começa com a doação de terras de um tal José Mateus dos Reis, um grande proprietário de terras lá pelos idos de 1845.
Comecei a gostar da nossa história e, ao longo da vida, fui vendo a dimensão das coisas por aqui, terra de Lobato. Que por sinal entendeu Taubaté por um ângulo muito triste e, de certa maneira, morreu sem perceber que o Sítio do Picapau Amarelo era e é aqui. Que se publique um elogio sequer que nosso mestre tenha verbalizado em louvor a sua terra natal.
Não me entendam mal os lobatólogos, mas, se éramos tão atrasados, de onde vinha toda aquela maravilhosa filosofia caipira com a qual ele lidou tão bem em suas histórias infantis? E nossas cidades mortas? Será que eram tão mortas assim? Talvez estivessem apenas matutando! E o Jeca fracasso humano? Éramos nós? Bem, a respeito do Jeca, Lobato reconheceu que errou na colocação.
Tenho certeza que se vivo fosse estaria infeliz, mas bastante otimista com sua região, afinal, tudo que ele pensou e sonhou teve, sempre, uma sutil intuição: um dia seríamos o que estamos, finalmente, começando a ser.
Mas que faltou um carinhozinho para com a terra de Jaques Felix, isso faltou. Faltou o gentil reconhecimento, pois todo grande homem começa no quintal de casa.Ser taubateano é, também, ter que suportar o fato de nossa cidade, a cada ano, ser menos a nossa e mais a cidade daqueles que vão chegando. O passado fica flutuando no ar enquanto outras paisagens vão surgindo. Taubaté é um filme tipo Guerra nas Estrelas, cheio de sequências.
Agora já cheguei em casa. No aeroporto em Ribeirão me encontro com Yves Beni, querido amigo de infância indo para o Rio com a esposa, curtir trinta anos de casados.
Reafirmamos o fato de termos sido felizes na terra de Cesídio. Comentei da fraternidade e da familiaridade daqueles dias. Ele explica para um amigo que estava no mesmo voo:
– É disso que o Renato tira a poesia dele!
É… meus amigos sabem de mim. Eu não sou um folclórico amante da terra em que vivi e muito menos estou querendo agradar alguma geração que não seja única e exclusivamente a minha.
Não tenho nada a dar e, em nenhum momento, retribui à altura tudo que tirei daí para usar na poesia. Eu sugo Taubaté, eu chupo Taubaté, porque minha alma poética precisa de certas lembranças para poder existir. Só isso.
___________
Renato Teixeira
Acompanhe o Almanaque Urupês também na nossa página do facebook e twitter
2 Comments
Maravilha!
Maravilha!
Comments are closed.