Todo fevereiro tem seu Carnaval
Texto de Dafne Araceli Román
Já diziam Los Hermanos “todo carnaval tem seu fim”.
Acabou e junto com o carnaval vem acabando aos poucos e mansamente o mês de fevereiro, abrindo alas ao verdadeiro ano de 2015. Agora sim as coisas começam a fluir. E que fluam. Por favor.
Não sou do carnaval, não que eu não goste dele, gosto, acho divertido, já pulei muito carnaval quando era mais nova, logo quando vim morar no Brasil, mas hoje não tenho o hábito, nem o pique e não vou falar que é a idade porque, cá entre nós, para pular carnaval não existe idade.
Talvez seja porque onde eu nasci não haviam fortes carnavais de rua, clube, bar e restaurante. Matiné? Não me lembro de ter ido a nenhuma durante a minha infância, acho que também não existia.
Mas, no meu país de origem existe um dos carnavais mais longos do mundo. Acreditam que há uma cidadezinha na Argentina – Gualeguaychú, onde tem um carnaval maravilhoso que começa no primeiro final de semana de janeiro e acaba somente na primeira semana de março? Nesta cidade, à beira do rio Gualeguaychú há até um “corsódromo” –arena- onde ocorrem os desfiles, dançando ao ritmo das comparsas.Os desfiles de carnaval mostram figurinos de alta qualidade e coreografias cuidadosamente sincronizadas com uma grande exibição de carros alegóricos impressionantes. Durante os desfiles de carnaval há centenas de personagens, muita criatividade e talento pode ser visto nos figurinos. Este é um dos carnavais da Argentina. Aliás, o mais imponente de lá. Chegou a ser considerado por vários veículos de comunicação do mundo como um dos melhores do mundo, assim como o é o do Rio de Janeiro, e o de Veneza.
Onde eu morava quando criança, a cidade tinha um rio também, o rio Paraná, mas o carnaval não era como em Gualeguaychú, que tinha seu imponente, colorido, alegre, musical, aliás, eu nem me lembro de ter carnaval na minha cidade. No máximo o que nós fazíamos era encher bexigas com água direto da torneira que ficava próxima à rua e saíamos estourando pela rua entre os demais vizinhos. Ganhávamos tubos de spray de espuma e saíamos à noite para a “peatonal” – um tipo de calçadão- lá a rua era fechada e nós podíamos brincar e correr durante à noite sem perigo algum, algumas vezes, não me lembro muito bem, havia música. Alguns dias íamos ao clube, pela tarde, mas lá não tinha festa de carnaval. Lá tinha churrasco, muitos hambúrgueres feitos na churrasqueira e banho de rio, que delicia que era se banhar no rio.
No meu carnaval não faltava serpentina e muito menos papel picado, para o qual eu ficava horas com a minha irmã e nossas vizinhas, Virginia e Florencia, picando revistas e jornais velhos sentadas no quintal de casa, engraçado, tudo isso para depois de uma ou duas horas brincando acabar jogando tudo no lixo. Era uma energia que não tinha fim, nos divertíamos com o mínimo e éramos felizes, muito. À tarde muitas das vezes em que não estávamos no clube entrávamos nas piscininhas de lona que cada uma tinha no quintal e no fim da tarde nos deliciávamos com um bolo e um copo de leite com chocolate que as nossas mães preparavam para nós, nossa diversão era garantida. Para as mães era melhor ainda, elas papeavam, tomavam mate –chimarrão-, pegavam sol, e à noite, conta minha mãe, nós –as crianças- dormíamos que era uma beleza, sono profundo. Aí elas aproveitavam para tomar suas cervejas e pina colada – nome original é PIÑA COLADA, já que PIÑA significa abacaxi em espanhol e é uma bebida feita com abacaxi- enquanto beliscavam alguma coisa para comer e proseavam sem parar. Bons tempos…
Porém, hoje fevereiro de 2015 o carnaval se foi mais uma vez e deixou como todas as outras vezes em que foi embora aquele sentimento de saudade, aquele vazio no peito. Em mim também deixou. Nostalgia dos dias em que os problemas não existiam, ou pelo menos, não eram lembrados. Saudades dos beijos e dos abraços que foram dados. Saudades das dancinhas e gracinhas. Saudades dos amores, famosos amores de carnaval. E quem nunca não se apaixonou no carnaval? Que bom que alguns destes que surgem nele conseguem ultrapassar vários outros carnavais.
Todo carnaval tem beijo, abraço, dança, sorrisos, quantos sorrisos. Todo carnaval tem suas máscaras, cada um tem suas máscaras. Tem música. Bloco na rua. Festa no bar. No restaurante e no clube. Todo carnaval, seja onde for, tem festa, onde entre confetes e serpentinas as bailarinas, fadas e super-homens dançam e pulam sem parar. Sorte a dos pais, já que de noite as crianças dormem feito pedra e ele podem aproveitar um pouco do que lhes resta de energia ao lado de seus amigos.
O carnaval é tudo isso e ainda mais, em qualquer lugar do mundo, de qualquer forma, com muito ou com pouco, é época de alegria, de liberdade, de diversão, descontração. O carnaval é época de brincar, dançar, cantar, perder a vergonha, criar personagens.
E agora que acabou mesmo, é hora de mãos à obra, dedicação, esforço e retirada das máscaras e fantasias. Vamos sorrir, todos os dias. Vamos dançar sim, rebolar dos problemas e dificuldades. Vamos estudar. Vamos trabalhar. Mas vamos acima de tudo, vamos esperar o próximo carnaval chegar. Porque no carnaval, aí sim, pode tudo! Pode máscara, pode fantasia, pode tudo…
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Dafne Araceli Román é argentina, escritora, professora de Espanhol e Português com formação em Letras. [/colored_box]
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