OS CAPUCHINHOS E O POVO DE TAUBATÉ: a chegada dos frades capuchinhos e as primeiras impressões em 1892

 OS CAPUCHINHOS E O POVO DE TAUBATÉ: a chegada dos frades capuchinhos e as primeiras impressões em 1892

Na imagem, o interior do Convento de Santa Clara em 1856 – Acervo Maria Morgado de Abreu

 

Por Amanda Oliveira Monteiro

 

A Igreja Católica no Brasil no período colonial era influenciada pelas irmandades e as Ordens Terceiras. Os padres e bispos tinham pouca influência sobre o povo, pois seu número era pequeno em relação a extensão territorial brasileira. Isso colaborou para que se formasse uma religiosidade em que as práticas portuguesas, fossem somadas às influências africanas e indígenas, culminando numa prática religiosa propriamente brasileira.

Durante o século XIX, no pontificado de Pio IX, a Igreja começou a mudar, no qual pretendia-se extinguir da religiosidade qualquer influência contrária a doutrina oficial da Igreja. Passaria a ser local de mediação entre Deus e seus fiéis e não local de se festejar. A Igreja Católica no Brasil começou a obedecer às normas da Sede Romana, o que acabou causando mudanças com tendências de separação dos poderes civis e eclesiásticos. A proclamação da República pôs fim ao catolicismo como religião oficial e obrigatória, e a Igreja Católica desligou-se institucionalmente do Estado.

Em Taubaté, no ano de 1890, Dom José Pereira da Silva Barros, então bispo de Olinda, e o vigário Antônio Nascimento Castro, e também o próprio bispo de São Paulo Dom Lino Deodato começaram a se mobilizar para trazer para a cidade os frades capuchinhos trentinos que faziam missões pelo Oeste Paulista, com residência em Piracicaba.

Fachada do Convento de Santa Clara em 1856. Foto de Robin&Fraveau.

Com o recebimento da escritura de doação de 24 de abril de 1891, frades capuchinhos trentinos aceitaram residir no Convento de Santa Clara. No dia 13 de janeiro de 1892, chegavam a Taubaté. Logo que chegaram, os frades priorizaram as missões, que consistiam em pregar e ministrar os sacramentos para o povo.

Em 27 de março de 1892, o jornal O Noticiarista publicou um artigo, em que exaltavam o trabalho dos capuchinhos, que naquele momento empregavam missões na Matriz da cidade. Elogiavam-se as pregações feitas por eles, e até mesmo justificava-se o mau uso do português, pelo fato de todos os frades serem italianos. Já o Jornal do Povo de 31 de março de 1892, refere-se aos Capuchinhos de uma maneira contrária. O articulista que se intitulava “Frei Diavolo”, criticou os frades, chegando a se perguntar se o Brasil era lixo para acolher pessoas como eles, acusando-os de cobrarem mais que o normal para celebrarem missas. Criticaram também suas pregações por serem muito enfáticas e rigorosas. Por serem, à época, todos estrangeiros, eram definidos como grosseiros. Essas pregações feitas na Matriz, no mês de março de 1892, além de dividir a opinião pública, causaram a indignação dos protestantes e um deles, tentou derrubar o frade que pregava do púlpito, sacudindo-o. Esse fato, segundo Felix Guisard Filho, resultou em “pânico, seguido de uma confusão medonha”.

Já na festa de São Francisco, transferida naquele ano para o dia 1º de novembro, pelo vigário Antonio Nascimento Castro, o mesmo jornal que os defendia, apresentava um artigo sobre a festa, em que criticava a ausência de música, que era comum nas festas religiosas. A festa de São Francisco proporcionava às pessoas momentos de lazer e naquele período, a Igreja centralizara a festa nas procissões e pregações. Além da música, os frades proibiram a os foguetes e a quermesse. Até mesmo o badalo do sino foi motivo para que acontecessem manifestos contra a presença dos frades que vieram para mudar os costumes dos taubateanos, chegando a convidá-los a irem para outro lugar.

Frei Ricardo de Denno, primeiro cronista da Ordem, que veio para o Brasil em 1894, relatou essas dificuldades com relação à participação da população e seus costumes que, para os frades, precisavam ser mudados. Depararam-se com a religiosidade tipicamente brasileira em que os costumes populares se mesclavam com a religião. As festas, com músicas, foguetórios, procissões, além do comportamento dentro das igrejas, escandalizaram os frades que não entendiam como a maneira certa de “praticar a religião”, segundo a doutrina oficial da Igreja.

Os frades capuchinhos da província de Trento, com sua atitude reformadora, numa época em que a Igreja queria se impor, sentiram o choque com aqueles que não queriam estas mudanças, por isso, por meio da imprensa, foram alvos de críticas. Mas o tempo passou, muitos pensamentos e ideias mudaram e 120 anos depois, a presença dos frades ainda é forte para muitos taubateanos.

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Amanda Valéria de Oliveira Monteiro é formada em História pela Universidade de Taubaté. Mestranda em Filologia e Língua Portuguesa pela Universidade de São Paulo. Trabalha no Arquivo Histórico Municipal Felix Guisard Filho com documentos datados a partir do Século XVII.

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