Os arquivos e a sociedade: um caso sério, mas de fácil solução
Quando na aula de ontem do professor da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Arquivo do Estado de São Paulo Carlos de Almeida Prado Bacellar sobre a carreira do historiador e as políticas de preservação, salvaguarda e descarte dos documentos, percebi que precisava compartilhar a reflexão acerca do estado atual de nossos arquivos do Vale do Paraíba.
Ao apresentar como vem atuando frente às políticas públicas durante sua gestão, o professor Bacellar relembrou o quanto foi e ainda é difícil convencer as autoridades públicas que se é preciso “gastar” uma parte do dinheiro do caixa do Estado com a preservação dos documentos históricos. Isso acontece porque mesmo os arquivos públicos sendo órgãos voltados para a preservação e disponibilização dos mesmos para a sociedade, não cabem somente à consulta de nós pesquisadores, mas de toda a sociedade, mas como essa concepção errada de arquivo é muito latente em nosso meio, as relações complicam no sentido de convencê-los do bem de preservar e disponibilizar a História ao acesso e consulta de todos.
Enquanto a noção de arquivo ficar só no âmbito das academias, o acesso e participação serão restritos e o fomento financeiro pode vir a ser muitas vezes negado. A própria concepção da história de um povo e sua memória está atrelada ao arquivo, pois muita gente nunca viu, ouviu ou pensou no que seja um arquivo e sua utilidade. Acreditam que é um espaço destinado a guardar “papéis velhos”, que não tem serventia ao povo, ou melhor, somente para os “loucos” historiadores e pesquisadores.
Quem nunca ouviu a máxima popular “lugar de coisa velha é no museu”? Aplico essa ideia ao arquivo também. Quer dizer que o povo ainda não mudou ou entendeu a verdadeira função social dos arquivos e museus. Essa função de trabalhar a questão com a sociedade cabe a nós professores de história e pesquisadores, mas muitas vezes por nos acharmos dissociados dessa atividade, nos tornamos “culpados” por manter nossos documentos enclausurados em enormes “torres de castelos medievais”, cujo acesso só cabe à nossa classe. Estamos fazendo errado. A História não é de nossa propriedade, ela é de e para o povo, nossa função á avaliar os feitos dos homens no seu tempo e espaço, não somos os donos da verdade.
Atrelado a esse sentido que é dado à documentação histórica e aos arquivos, está a realidade de nossos arquivos do Vale do Paraíba. Alguns não existem, pois não tem espaço para armazenamento dos documentos, quiçá espaço para consulta de todos. Os poucos que comportam espaços para pesquisa e consulta, uns estão fechados por falta de equipe e pagamento e outros acolhem e recebem muito bem pesquisadores e a população em geral, mas são raras exceções.
Além disso, temos problemas de infraestrutura que já danificam há anos os documentos a ponto de perdê-los e outros até são vendidos nas feiras do mercado como objetos sem valor histórico. Uma pena, pois a história do Vale se confunde com a história do país, no qual os nossos documentos são inéditos muitas vezes na composição dos primórdios da nação.
Não cabe à minha fala neste texto justificar os problemas que ocorrem das políticas públicas com relação aos arquivos ou julga-los, mas sim o intuito de suscitar na sociedade o questionamento sobre aquilo que é um direito dela: que os arquivos públicos disponibilizem os documentos da sua história para a consulta de todos.
Bibliografia:
BACELLAR, Carlos A.P. Uso e Mau uso dos arquivos In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.). Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2005. pp.23-79.
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Giovanna Louise Nunes é graduada pela Universidade de Taubaté, Mestranda em História Social pela Universidade de São Paulo. E professora na Rede Estadual em Taubaté.
1 Comment
Parabéns Giovanna Nunes pelo artigo que nos faz refletir sobre a questão dos arquivos públicos.Profa.Kátia Rico.
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