O CRIME NA POLÍTICA OU A POLÍTICA DO CRIME
Em outubro de 1905, o jornal “A Verdade” da cidade de Taubaté trazia como título de um artigo de primeira página “A política e o crime” no qual considerava lamentável a influência do crime na política.
Considerando que a política deve ser a ciência da administração e organização de um Estado, torna-se essencial a ética para seu pleno desenvolvimento, porém, talvez seja quase impossível, na prática, o governante planejar unicamente com a finalidade de se alcançar um bem maior, segundo as necessidades da população. De acordo com o texto de 1905, o desvirtuamento dos ideais da política ocorre a partir do momento em que ela se torna um ofício, um meio de sustento.
Ao se tornar um ofício, a política teria seu caráter corrompido desenvolvendo a fraude e a corrupção, enfraquece o sentimento da justiça e o amor ao trabalho[1]. Mesmo que discordemos do que é dito neste momento, pois alguns poderiam considerar que para haver a profissionalização da política seja necessária a sua remuneração, tornando o ingresso mais igualitário a todas as pessoas. Outros podem rebater, dando razão ao artigo de 1905, considerando este aspecto a origem de todos os males.
Vale lembrar que a profissionalização não exige apenas a remuneração, como também, a especialização. A especialização, por sua vez, compreende o estudo e o aperfeiçoamento da prática administrativa governamental, mas ao mesmo tempo, exige o aprimoramento das técnicas eleitorais, ou seja, o político profissional deve saber ou se cercar de pessoas que possam o fazer eleito.
Do mesmo modo que a política pode ser considerada como um solo fértil da criminalidade, a sua ausência pode ser o foco gerador em uma sociedade. Citando o médico francês e criminologista Dr. Lacassagne, o jornal diz que na falta da política ou em seus períodos conturbados, a violência torna-se comum, expressando-se em assassinatos ou em eleições fraudulentas, pois segundo o criminologista o ambiente social seria uma terra favorável à criminalidade e o micróbio ou a semente seria o elemento criminoso que não possui importância, até o momento no qual ele encontra um ambiente propício à sua proliferação[2].
Referindo-se à situação política dos Estados Unidos, “A Verdade” diz que o dólar é o elemento preponderante e quase definitivo em seus planos eleitorais e, portanto os eleitores acabam sendo seduzidos por um ideário de promessas políticas. Ao longo do tempo, porém, tornam-se céticos e o ato de votar adquire a característica de ser prático. Quando não é possível a venda direta do voto, o candidato maneja sua delicadeza pelas subscripções a favor das instituições de beneficência ou de utilidade publica[3]. Isso ocorre segundo o texto nos países do Norte das Américas. Já nos países de origem latina, a paixão política torna todos os meios de corrupção legítimos e oportunos e, por isso, os serviços eleitoraes são pagos em funções publicas, muitas vezes com grave prejuízo da justiça e dos interesses sociaes[4].
Tanto no caso dos americanos do Norte, quanto no dos de origem latina, quando vigente o cenário acima descrito, nem mesmo a redação da melhor lei seria capaz de resolver os problemas da população, devido a incapacidade das autoridades se comprometerem com as obrigações políticas.
Para agradar esses grupos que o jornal intitula de “os violentos”, a política separa-se da moral, da justiça e da liberdade [e] supprime-se o horror que o crime deve inspirar[5].
Segundo os argumentos utilizados no texto, não existiria uma forma correta de governo (república X monarquia), mas sim uma única guiada segundo as necessidades da população e princípios éticos. Apesar dessa última informação não soar tão bem na prática quanto aos ouvidos, nos resta uma reflexão a respeito da prática política, seus ideais e sua funcionalidade nos dias atuais, que como pode se notar não é uma preocupação apenas contemporânea.
[1] A Verdade – 24/10/1905.
[2] le milieu social est le bouillon de culture de la criminalité ; le microbe, c’est le criminel, un élément qui n’a d’importance que le jour où il trouve le bouillon qui le fait fermenter (http://criminocorpus.revues.org/112) .
[3] A Verdade – 24/10/1905.
[4] A Verdade – 24/10/1905.
[5] A Verdade – 24/10/1905.
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Fabiana Cabral Pazzine é professora de história. Pesquisadora de História Cultural e Social.