Darwin Ronconi – músico e musicólogo

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Almanaque Urupês: Como você define cultura?

Darwin Ronconi: Creio haver várias abordagens para a definição de cultura; genericamente adoto a do antropólogo britânico Edward Burnett Taylor, o qual diz ser a cultura “todo o conjunto de elementos que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo Homem como membro de uma sociedade”.

Etimologicamente o vocábulo cultura vem do latim colere que significa “cultivar”. Nesse sentido, podemos afirmar que a cultura é um conjunto de atividades, conceitos, definições, valores, costumes e crenças ligadas a uma tradição social que pode ou não ser mantida, praticada e desenvolvida. Quando comparamos o Brasil com a Inglaterra, por exemplo, observamos que ambas as nações são multiculturais, contudo, o povo inglês é muito mais apegado às suas tradições, enquanto que o povo brasileiro pouco ou nada entende e vivencia verdadeiramente alguma tradição cultural.

Historicamente no séc. XVIII a cultura foi associada ao conceito de civilização, como conseqüência a cultura passou a ser associada a noções de desenvolvimento, educação, bons costumes, etiqueta e comportamentos de elite. Essa associação entre cultura e civilização foi comum, sobretudo, na França e na Inglaterra dos séculos XVIII e XIX, onde cultura se referia a um ideal de elite. Surgiu então a separação e hierarquização entre cultura erudita ou alta cultura e cultura popular, ainda vigente nas sociedades ocidentais.

Creio que cultura seja o conjunto das manifestações humanas que contrastam com a natureza ou com o comportamento natural instintivo de nossa condição animal e está intimamente ligada à intelectualidade, sabedoria e criação, visto que se constitui por um conjunto de conhecimentos teóricos e práticos que se aprende e transmite aos contemporâneos e aos que virão. Porém, o Homem não só recebe e apreende a cultura dos seus antepassados, ele também cria elementos que a renovam. Sendo assim a cultura é um fator de humanização; a criatura humanóide só se torna Homem porque vive no seio de um grupo cultural.

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Enfim, creio ser a cultura um sistema de símbolos compartilhados com os quais se interpreta a realidade e que conferem sentido à vida dos seres humanos.

AU: Existe política publica cultural em Taubaté?

Darwin Ronconi: Bem, tomando como início de nossa análise a década de 1980 (pós ditadura) até nossos dias, podemos afirmar que nunca houve de fato em Taubaté uma política pública planejada, custeada, realizada, mantida e verdadeiramente interessada no fazer cultural . Temos de reconhecer que nos mandatos dos ex-prefeitos José Bernardo Ortiz e Antônio Mário Ortiz houve iniciativas culturais louváveis como as restaurações da Capela de N.S. do Pilar, do Órgão de Tubos da catedral de S. Francisco das Chagas, do Teatro Metrópole, do casarão da rua Visconde do Rio Branco (que se tornou o saudoso Solar das Artes), na construção dos parques municipais e na revitalização de alguns espaço como praças e coretos. Mas não apenas restauração, construção e revitalização desses monumentos, também na elaboração e realização de programações artísticas e educativas como concertos musicais, exposições de artes plásticas, peças de teatro, palestras e cursos. Tudo sempre gratuito para quem quisesse assistir e/ou participar. Contudo, não foram criados leis nem incentivos fiscais para realização de atividades culturais. Tomemos como exemplo o descaso do poder público na conservação dos imóveis do centro histórico da cidade. Hoje podemos contar nos dedos os casarões e outras construções mais antigas do centro de Taubaté. Ao caminharmos pelas ruas centrais nos deparamos com uma poluição visual caótica das fachadas das lojas entremeadas por grades e telas dos estacionamentos criados para o lucro de seus proprietários e tornar o trânsito do centro ainda mais complexo, (visto que os manobristas utilizam as ruas como pátio de manobras). A descontinuidade na realização dos projetos por conta das mudanças de prefeitos e o despreparo técnico das senhoras e senhores que já foram secretários de cultura  também foram agravantes no desenvolvimento da quase nula vida cultural taubateana. Não temos programação fixa para nenhuma das artes. Nossa cidade não faz parte de nenhum circuito cultural importante e expressivo, nossos artistas de alto nível são obrigados a migrarem para outras localidades por conta dessa aridez cultural, mas isso não é um problema exclusivo de Taubaté. Nenhuma cidade do Vale do Paraíba faz parte de circuito cultural algum! Não há políticas públicas culturais!

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Pessoalmente tenho esperança que a situação melhore, pois conheço a visão empreendedora do prefeito Jr. Ortiz e de seu muito bem escolhido secretário de cultura Sr. José Saud. (Digo isso não por bajulação, mas por conhecer o trabalho desses distintos cidadãos em suas respectivas áreas). Além disso, contamos com duas vereadoras muito comprometidas com a educação e a cultura, as vereadoras Polyana Gama e Vera Saba (essa última minha ex-aluna de canto).

AU: Em qual estágio de desenvolvimento está a produção musical em Taubaté, em particular, a da música erudita?

Darwin Ronconi: Sobre música popular em Taubaté nada posso dizer pois não trabalho com música popular, mas sobre a música erudita posso afirmar que produção musical de fato nunca existiu por aqui! A UNITAU já manteve orquestra sinfônica e coral, mas nunca investiu em qualidade nem em publicidade. Os raros concertos foram assistidos por poucas pessoas e a qualidade das performances foi sempre sofrível. Há atualmente grupos cameríticos de ótimo nível artístico já consagrados regionalmente como o Quinteto de Taubaté e a Camerata Zajdenbaum e instrumentistas também de ótimo nível, mas como não há “meio” para atuação, ou seja, não há séries ou ciclos freqüentes e perenes de concertos, não há produção musical. Consegui estabelecer-me como instrumentista concertista e desenvolver uma carreira de músico erudito atuante migrando primeiramente de Taubaté para São Paulo afim de completar e qualificar minha formação profissional. Há muitos bons músicos taubateanos tocando e vivendo em diversos Estados do Brasil. Esses músicos poderiam e deveriam estar aqui enriquecendo a vida cultural de nossos conterrâneos!

AU: Na sua avaliação, em nosso município, qual seria o modelo de política cultural mais adequada para desenvolver a produção musical?

Darwin Ronconi: Serei muito breve e claro nessa resposta:

O melhor modelo de política pública cultural é aquele no qual há real interesse da gestão pública em tratar a cultura como prioridade, investindo o necessário para a realização de projetos selecionados de acordo com as necessidades culturais da municipalidade. Esse interesse traz consigo o compromisso de designar agentes culturais verdadeiramente capacitados e experientes na elaboração e realização das programações de atividades artísticas e culturais. Nesse contexto, a divulgação tem um papel importante; a programação cultural, por melhor que seja, estará fadada ao fracasso se a divulgação não for concebida de forma a despertar interesse no público.

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