Getúlio Vargas: atentado em Taubaté
Getúlio Vargas discursava em plena praça D. Epaminondas quando foi jogado no chão do palanque por Gregório Fortunato, seu guarda costas, para escapar das balas disparadas por Jaurés Guisard.
Esta é a síntese, que tem variações dependendo de quem a conta, de uma das Histórias que assumiu proporção de lenda urbana em Taubaté. Provocado por um arguto leitor, Almanaque Urupês saiu a campo para buscar documentos e informações confiáveis que lancem luzes sobre um dos casos mais marcantes do folclore político valeparaibano.
Registros da imprensa taubatena
Começamos nossa investigação na Hemeroteca António Mello Jr., que integra o Arquivo Histórico Felix Guisard Filho. Na coleção de jornais, encontramos a primeira referência da passagem de Getúlio Vargas por Taubaté no jornal O Correio do Vale de 1º de novembro de 1947. Em nota, o periódico informa que o então senador faria naquele dia um comício em Taubaté em apoio a candidaturas de correligionários para as eleições que ocorreriam ainda naquele mês.
Infelizmente a coleção de jornais que cobrem 1947 tem lacunas durante o período posterior ao citado comício. Em Taubaté não encontraríamos as respostas a nossa indagação.
A verdade está lá fora
Buscamos então os arquivos da Biblioteca Nacional. A instituição disponibiliza desde 2012 na Hemeroteca Digital Brasileira, milhões de páginas de periódicos brasileiros, muito raros ou já extintos. A primeira prova eloquente da turbulenta passagem de Getúlio Vargas por Taubaté nos foi apresentada pelo jornal Diário de Notícias, edição de 29 de novembro de 1950. Nela, lemos a menção textual de um atentado que Vargas teria sofrido em Taubaté e do envolvimento de Jaurés Guisard no episódio.
Como a pista era quente, voltamos nossas atenções para os registros oficiais da Assembléia Legislativa em busca das notas taquigráficas da sessão mencionada na notícia. Consultamos edições do Diário Oficial digitalizados pela Imprensa Oficial. A leitura atenta da atas nos revelaram detalhes importantes para entendermos a paisagem política da Taubaté daquela época. É importante que citemos que a nossa pesquisa foi facilitada pelo mui louvável JUSBRASIL, portal dedicado a organizar e disponibilizar documentos públicos para a consulta livre, leve e solta na internet. E vamos aos fatos.
No Diário Oficial da Assembléia Legislativa publicado em 17/11/1948, lemos um ofício enviado pelo então governador Ademar de Barros respondendo a requerimento do deputado Cunha Lima pedindo esclarecimentos sobre “ocorrências verificadas em comícios realizados pelo então senador Getúlio Vargas nas cidades de Taubaté, Ribeirão Preto, São Paulo e Sorocaba”.
Na resposta, o governador se valeu de relatório elaborado pela Secretaria de Segurança Pública. O documento confirma que a passagem de Vargas por Taubaté foi tumultuada. No texto, chancelado pelo Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (DEOPS/SP), o delegado Manuel Ribeiro da Cruz afirma que a vinda Getúlio Vargas a São Paulo “em propaganda eleitoral” obrigou o DEOPS a tomar providencias excepcionais para garantir a segurança do senador gaúcho, dizendo que “os motivos dessas apreensões são notórios e dizem respeito aos antecedentes políticos desse Senador, acrescidos pela situação criada em virtude das alianças políticas levadas a efeito pelo Partido Trabalhista Brasileiro com o extinto Partido Comunista Brasileiro”, escreveu o delegado.
Antes de avançarmos, é importante contextualizar, a nosso modo, as razões das “notórias apreensões” despertadas nas autoridades do DEOPS pela presença de Getúlio Vargas em terras paulistas.
Receitas de um ditador
Getúlio Vargas foi deposto da Presidência da República após ocupá-la por 15 anos(1930-1945). Nesse período, derrotou os paulistas na Revolução de 1932,
exterminou comunistas na Intentona de 1935,
massacrou integralistas na intentona de 1937 e tornou-se ditador no mesmo ano, silenciando habilidosamente a democracia. O Estado Novo começou em 1937…
…e terminou derrubado por militares em 1945. Getúlio apoiou o general Dutra(seu ex-ministro da Guerra) como candidato vitorioso à Presidência neste mesmo ano em que ele [Vargas] próprio foi eleito senador. Tinha início o “Estado Novíssimo” (segundo Monteiro Lobato).
Em 1947, Getúlio preparou terreno para ocupar novamente à cadeira da Presidência, desta vez pelo voto. Vargas tiraria proveito das eleições de novembro, quando seriam escolhidos vereadores, prefeitos e vice-governador para conquistar corações e mentes no estado de São Paulo. As manchetes dos jornais da época registraram as elevadas opiniões e os nobres sentimentos que o senador gaúcho despertava em muitos paulistas.
“São Paulo não quer ser o campo de batalha entre Dutra e Getulio, como na Espanha assolada por Esquerdistas e Nazifacistas“, exagerava a manchete do jornal O Estado de São Paulo, revelando disputa entre ex-aliados.
“Por toda parte sentirás o desprezo e a indignação dos paulistas. Dos mortos de 32 e dos vivos de 37 e de 45” ameaçava o editorial do Jornal de Notícias, que tinha entre seus diretores o taubateano Carlos Rizzini.
“Getúlio e Prestes vão puxar a mesma canga; irreconciliáveis inimigos de ontem mostram que a vergonha é coisa secundária quando fala a ambição” estampava o Diário do Paraná,fazendo alusão a aliança entre o comunista Luiz Carlos Prestes e o anti-comunista Getúlio Vargas.
Tô nem aí
Getúlio iniciou sua tour por São Paulo justamente no palco em que se desenrolaram sangrentos e decisivos combates da Revolução de 1932. Para melhorar o ambiente, muitos dos ex-combatentes, derrotados pelas tropas do ex-ditador, eram moradores da região. Havia ainda o grupo dos políticos destituídos por Getúlio em 1937 (Taubaté viu cassados os vereadores empossados em 1936).
A jornada de Getúlio Vargas pelo Vale do Paraíba rendeu relatos que misturam aventura, suspense, ação, violência em doses cinematográficas.
Este é o assunto do próximo capítulo.
A seguir(em clima de suspense cinematográfico):
Guaratinguetá conflagrada; Violência e morte em Taubaté! Getúlio Vargas voltou!!!
E finalmente a resposta: Jaurés Guisard atirou em Getúlio Vargas?
1 Comment
Pedro, parabéns pelo material e bela pesquisa.
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