CONSERVAÇÃO, PRESERVAÇÃO E DESTRUIÇÃO DA MEMÓRIA
Fabiana Pazzine fala sobre causas e consequências da manutenção e a destruição dos patrimônios históricos
O que nos leva a conservar, substituir ou a destruir? Esta pergunta não cabe apenas aos monumentos históricos, mas as coisas de forma geral…
Como resposta talvez tenhamos os sentimentos, ou então a memória.
Conservamos tudo aquilo que nos traz boas lembranças, em contrapartida, substituímos o que nos traz más recordações. A destruição se dá naquilo que não possui significado para nós. Esses processos descritos ocorrem diariamente tanto em nossa casa, quanto em nosso município, tanto no campo material, quanto imaterial. Conserva-se, preserva-se e destrói sentimentos, tradições e monumentos.
O que torna algo tradicional é o significado, a memória e a permanência ao logo do tempo. Repetimos ações significativas e repletas de sentimentos.
Já ouvi dizer que se há algo nos dias de hoje que é considerado como alvo de merecimento de culto e admiração sem nunca falhar, é o dinheiro, que é considerado superior a um deus: trabalha-se em seu nome, guiam-se ações por ele e deixam-se de lado ideologias e crenças. Por isso, o nosso sistema capitalista não vai de encontro a alguma regra moral, muito menos imoral, ele é neutro a tudo isso, desconhece esse tipo de necessidade. Não condena, mas também não dita regra alguma. Seu objetivo é o lucro…
Diante de nossas necessidades financeiras, será que conservamos o que nos interessa comercialmente? Substituímos a memória, os sentimentos, pelo dinheiro? A identidade das pessoas e das cidades se tornaram objetos menores diante da globalização e seus efeitos?
Perguntas à parte, o que de fato vem ocorrendo é a desvalorização do patrimônio público, não no sentido do valor financeiro, mas sentimental.
O prédio que outrora era um marco bonito e elegante, motivo de orgulho para os moradores da cidade, torna-se motivo de medo, pois, relegado ao abandono não dificilmente pode ser reduto de bandidos e então passa a ser medonho e ultrapassado.
A igreja e o sino, que ditavam o ritmo da vida dos habitantes passam a ser a “coisa velha”, que muitas vezes atrapalham “o bom desenvolvimento” urbanístico das regiões. E impedem, talvez, a ordem natural das coisas: o moderno deve substituir o superado.
Exemplos não precisam ser ditos, pois eles são presenciados hoje, já foram vistos no passado e, com certeza (infelizmente), serão vistos no futuro, mas o que não pode ser esquecido é que estamos nos tornando desmemoriados e no futuro quando talvez tentarmos nos recordar de como era a cidade no passado, esse será um exercício mais difícil, com certeza.
A história da cidade estará em suas construções e desconstruções, pois também somos aquilo que não conservamos, que suplantamos ou deixamos acontecer… Teremos registrada a história de um povo que achou um dia ser démodé ter um passado dos tempos em que o Brasil era apenas uma Colônia de Portugal.
Não seremos um povo sem história, porém, talvez seremos um povo com identidade confusa que não (re) conhece seu passado e só olha para frente e tão alto que corre o risco de tropeçar.
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Fabiana Cabral Pazzine é professora de história. Pesquisadora de História Cultural e Social.
3 Comments
O “alerta” foi dado, com maestria, na última frase do texto! O “Almanaque Urupês”, atraves de seus cronistas, me faz lembrar a passagem bíblica do “O Semeador”…tomara que as sementes estejam a cair, em maior quantidade, nos “solos férteis”….
Solos férteis existem, só espero que alguma semente seja capaz de alcançá-los…
Que a memória principalmente dos vencidos não se perca.
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