NO VALE – Por Renato Teixeira
Nos meus anos valeparahybanos de tudo vi, não ouso dizer que “tudo aprendi’, porque há muito adotei a máxima socratiana do “só sei que nada sei” como filosofia de vida. Uma das coisas mais me intrigantes do meu “lembrar” taubateano: nunca vimos discos voadores naqueles tempos. Ninguém; nem eu, nem o Júlio Guerra, nem o padre Evaristo, nem ninguém. Nem os bêbados. A conclusão que eu chego é que por aqui os extras terrestres não chegam.
Pode ser que cheguem a Tremembé, mesmo que via Rádio Difusora num dos maiores engodos radiofônicos de todos os tempos quando um professor de matemática, cujo nome infelizmente eu não recordo, resolveu imitar Orson Wells e promoveu uma invasão de marcianos que parou a cidade e esvaziou o estádio do bosque num dia de jogo do Santos com Pelé e tudo. Felizmente, ninguém se suicidou se atirando das janelas como ocorreu nos Estados Unidos. Talvez porque não tivéssemos prédios altos, bons para suicídios. Como nada acontecia na área astronômica, a gente quase não falava sobre o improvável. Confesso que só ouvi falar na física quântica, por exemplo, quando já morava em São Paulo. Nem física quântica; vejam vocês!
Fatos estranhos, confesso que não me lembro de nenhum. Talvez aquela viagem da fanfarra do Estadão para Lorena quando nosso amado editor chefe resolveu subir no teto do trem em movimento e tocar fogo no vagão.
Alguns fatos, como a fuga do rapaz que emprenhou a moça e preferiu fugir, poderiam ser considerados “fatos estranhos”, mas hoje em dia as pessoas nem se casam mais… tem moça que engravida e nem sequer aos próprios pais revelam o nome do inseminador.
Certa vez, uma grande amiga foi contratada por uma multinacional da região para desvendar o perfil psicológico do cidadão taubateano. Foram seis meses de trabalho que ao fim deixaram minha amiga em estado de choque. Não vem ao caso entrarmos nos detalhes da pesquisa porque dez números completos do nosso Jornal seriam insuficientes para contar tudo.
O fato é que minha amiga se internou numa clinica de recuperação para tentar continuar vivendo normalmente, como antes da pesquisa. Minha amiga também ficou eternamente agradecida pelo fato de eu ter lhe apresentado o mestre Zé Carlos Sebe por quem ela desenvolveu uma admiração intelectual incontida. Confessou-me que, não fosse a lucidez do Zé, ela poderia muito bem afirmar que Taubaté fica em outro planeta.
Como vocês podem perceber, Taubaté tem um mistério que ninguém decifra e que, segundo Mayra, mulher do Tony Campelo, se deve ao fato de a cidade estar pousada sobre uma imensa pedra que vai de Pinda a Caçapava, irradiando uma energia que mantém tudo em suspensão permanente. Talvez estejam aí as impossibilidades dos discos voadores na nossa cidade.
Eu não sou exotérico e nem quântico, pois, ter que inventar música já satisfaz meus compromissos com os mistérios da vida. Acredito no que não vejo e aceito o que não é. Acho também que o que não existe pode vir a existir de uma hora pra outra. Tenho a certeza absoluta que outras dimensões também estão por aí esperando a hora de entrar em cena. É tudo uma questão de tempo.
A minha Taubaté, aquela que eu habitei, continua viva, repercutindo em algum lugar do espaço, bem mais do que uma simples lembrança, uma coisa física bem real, palpável. O universo ainda não se revelou completamente para a humanidade. A nossa cidade ainda não é o que será e tudo o que já foi não deixará jamais de existir.
Por isso estamos aqui, nós os humanos que rebanhamos almas e espíritos através das artes; para deixarmos claro que a jornada está apenas começando e o improvável estará sempre grudado em nós esperando que o nosso querido e admirado Professor Marmo nos mostre o caminho.
Lá onde tudo está
Ainda não é
Tudo o que será amanhã
Lá por onde eu passei
Ninguém vai chegar
Antes de viver
La não há
Quando eu vim da minha terra
Pela Dutra num fuscão
Eu só era uma camisa velha
Um sonho e um violão
E tudo que eu vivi
E tudo que sonhei
Eu trago guardado
No fundo do meu coração
Céu
Máquina geral
Outras dimensões
Aparecerão mais além
Não quero compreender
Eu só quero estar
Eu só quero olhar… e viver
Lá no Vale
De noitinha
Eu pegava um violão
E compunha umas coisinhas
Só e são
E tudo que sonhei
Eu trago guardado
No fundo do meu coração
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Publicado originalmente na edição 564 do Jornal Contato