Guerra Paulista. Notas sobre o conflito de 1932

 Guerra Paulista. Notas sobre o conflito de 1932

Por Lygia Fumagally Ambrogi

Pequena Cronologia da Revolução Constitucionalista

24/05 Para muitos, a revolução começou nesta data: a multidão assalta prédio no cruzamento da (atual) Av. Ipiranga com R. Barão de Itapetininga, sede da Legião Revolucionária, tida por tropa de ocupação. Morrem Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, cujas iniciais se tornaram símbolo do movimento revolucionário: M.M.D.C.
08/07 O General Bertoldo Klinger é reformado e afastado do comando da Circunscrição do Mato Grosso. Tal afastamento, segundo os planos da Frente Única, era motivo suficiente para fazer eclodir a Revolução.
09/07 Euclides Figueiredo ocupa a sede da Região Militar de São Paulo: está aberta a Revolução. Paulistas ocupam o túnel mas não avançam sobre o rio, a espera dos aliados gaúchos e mineiros.
12/07 O General Klinger chega a São Paulo e assume o comando, designado pelo General Isidoro Dias Lopes que não o pode exercer por razões de idade e saúde. O Coronel Figueiredo vai comandar a frente do Vale do Paraíba.
15/07 Primeiro choque entre constitucionalistas e ditatoriais, na altura do Clube dos duzentos, via Dutra. Posições mantidas, a frente estabelecida.
17/07 Primeiro grande revés dos constitucionalistas: o dispositivo defensivo de itararé, na frente sul, é abandonado sem combate.
23/07 O chamado “Sábado Fatídico”: aviões ditatoriais bombardeiam o Campo de Marte, atingindo também o Clube Esperie; em Santo Amaro, explode um morteiro, matando o comandante da força pública e outros oficiais, fazendo também muitos feridos; no Guarujá, Hotel de la Plage, Santos Dumont suicida-se, desgostoso em ver seu invento- o aeroplano- servindo para matar irmãos, pois durante a manhã percebera aviões “vermelhinhos” dirigindo-se para o bombardeio do Forte de Itaipu.
29/09 O General Klinger propõe amistício, por sua iniciativa.
01/10 Assinatura da “Convenção Militar” que retirou a força pública das trincheiras constitucionalista.
02/10 O Governador constitucionalista Pedro d Toledo é deposto por oficiais da força pública, já obedientes ao Governo Provisório.
Último combate em território paulista: Perigo, junto ao Rio Paranapanema.
11/11 Os chefes constitucionalistas condenados ao exílio chegam a Lisboa.

 Epopeia Paulista

09 de julho de 1932: a capital paulista desperta com os ruídos da guerra civil. O povo oprimido pela ditadura, reagiu buscando um governo democrático, e a revolução constitucionalista, surgiu qual uma bomba relâmpago pró liberdade; Na véspera, inúmeros pelotões de jovens, faziam exercícios nas ruas e ninguém sabia o por que. Os moços saiam de casa com as roupas comuns e só voltavam ao lar, já fardados para se despedirem da família.
Foi um delírio! A cidade inteira estava em tremendo reboliço- Os primeiros jovens estudantes, de curso superior a pagarem com a vida, seu idealismo, foram- Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo, surgindo então o símbolo de luta MMDC. Nas ruas e em todo o estado, surgiram significativos cartazes, com um soldado dizendo: Paulista, você tem um dever a cumprir!
Foi uma loucura. Os moços se alistavam e os batalhões partiam para a frente de batalha, rumo ao Rio de Janeiro. Surgiram inúmeros hinos revolucionários, que sob a batuta do maestro Leo Ivanov, íamos cantar na Rádio Record, pois o ginásio Independência, entrou no movimento e nós alunos, fomos também convocados e nos puzemos a disposição da ilustre Pérola Bigton, presidente da Cruzada Pró Infância.
Na ocasião eu era comandante do Batalhão Firmino do Ginásio Independência, liderando um grupo de trabalho pró revolução.
Foi fantástico. Todos cooperaram, ricos ou não. Um dos meus irmãos, o Vicente, alistou-se a partiu. Foi combatente na zona do túnel e foi ferido. Na sua partida para o front, fui até o Quartel, na Avenida Tiradentes, para me despedir dele e tive a ocasião de conhecer um dos homens mais cultos do Brasil, Ibraim Nobre.
O discurso que ele proferiu foi empolgante, um dos mais belos que já ouvi. Falou do alto de uma pilha de caixotes e ainda me lembro de parte de sua oratória. “Paulistas! Vamos vencer está luta e libertar nosso amado Brasil desse mal da ditadura vil e vergonhosa! Vamos levar vitoriosos um pé de café, para plantar no obelisco da Avenida do Rio de Janeiro. Sim. Um pé de café… Quando ele florecer, lembrará as lágrimas das mães, esposas, noivas, parentes e amigos, que perderam os seus entes queridos, lutando pela vitória da democracia. Quando os frutos ficarem vermelhos, lembrará o sangue dos nossos heróis, derramando na trincheira, pela causa sublime da Liberdade!”
O discurso foi então interrompido, porque um avião teco-teco, vermelho, lançou uma bomba que quase caiu no quartel. Foi uma correria louca. Os militares começaram a gritar para o povo deixar o local e a retirar rapidamente o pessoal. Meu irmão me fez sair correndo e o avião fez um vôo rasante que mais assustou o povaréu.
Foi um ato inesquecível, que sempre guardei com carinho, emoção e orgulho. 

Prenúncio: o MMDC

Em maio de 1932 espalhou-se em São Paulo a notícia de que o ministro da Fazenda, Osvaldo Aranha, iria ao estado para impor um secretariado ao interventor Pedro de Toledo. Logo foi organizado um movimento de protesto, reunindo uma multidão no dia da chegada do ministro à capital paulista. No dia seguinte, 23 de maio, enquanto uma comissão ia falar com o interventor, a população começou a tomar conta das ruas. Durante a manifestação, surgiu a idéia de tomar a sede de uma organização tenentista, a Legião Revolucionária. Os manifestantes, no entanto, foram recebidos a tiros pelos tenentes. Quatro jovens foram atingidos e morreram: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo. As iniciais de seus nomes – MMDC – foram usadas por uma entidade que desempenhou papel de relevo na organização da guerra civil que eclodiria dois meses depois.

Afinal, o que foi a Revolução de 32?

“…uma daquelas causas pelas quais os homens podem viver com dignidade e morrer com grandeza.” Jucelino Kubitschek, mineiro, atuou ao lado do Governo Provisório. “O mais brilhante movimento cívico da história do Brasil republicano.” Euclides Figueiredo, comandante no Vale do Paraíba da principal das divisões do exercito constitucionalista “…os ricos entregam seu ouro com descrição britânica e bravura romana; as senhoras despojam-se de suas jóias; os bispos entregam o ouro da igreja e as suas próprias cruzes pectorais; os casais pobres levam à coleta suas alianças; os advogados, os médicos, os seus anéis.” Bertoldo Klinger, gaúcho, generalíssimo revolucionário, escrevendo ao general Góis Monteiro Estas definições, nenhuma assinada por paulistas, demonstram que a história, pelo juízo dos homens foi um evento único. Segundo o pesquisador Hernani Donato, a Revolução Constitucionalista de 1932 pode ser definida como “explosão de idealismo levado as últimas conseqüências”, motivando quase duzentos mil homens, oriundos de todas classes sociais, a pedirem armas e lugar nas trincheiras, insurgindo-se contra o Governo de Getulio Vargas, no poder desde a Revolução de 30 e governando o país sem uma constituição.

Esforços de Guerra

Os acontecimentos do dia 23 de maio de 1932 estimularam a articulação dos paulistas em favor do constitucionalismo. Às vésperas do conflito, Minas Gerais e Rio Grande do Sul acenaram com apoio ao movimento armado em São Paulo. Flores da Cunha, interventor no Rio Grande do Sul, chegou a prometer pegar em armas contra Vargas.

O exercito constitucionalista foi formado por quase 18 mil voluntários inexperientes em combate, aproximadamente 10 mil praças da Força Pública (a PM de hoje) e por quase 3000 recrutas do Exército Nacional.

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, sob a presidência de Roberto Simonsen, determinou que várias fábricas fossem convertidas para a produção de balas para fuzil, granadas para canhões, capacetes de aço, mascaras contra gás, rações de campanha, trens blindados, carros de assalto, lanchas blindadas, minas marítimas e terrestres, carros lança-chamas, além de “armas de mentirinha” , entre elas a matraca, que imitava o matraquear de metralhadora pesada e o canhão bresseriano ou canhão fantasma que não disparava, mas enganava a observação aérea.

O rádio foi utilizado em larga escala na mobilização, que mesclava o tema da constitucionalização ao da autonomia de São Paulo, ressaltando a superioridade do estado.

Quem paga a conta?

A guerra tinha um custo elevado. Era preciso garantir São Paulo funcionando com a mínima normalidade. Porém, o Tesouro do Estado, nestes tempos de crise, estava a zero.

Organizações como a Liga de Defesa, o MMDC e o Instituto do Café iniciaram o alistamento de voluntários. 80.000 mulheres, trabalhando graciosamente, costuraram fardamentos, teceram agasalhos, prepararam material médico, cozinharam refeições, atenderam hospitais e famílias cujo o arrimo havia seguido para o campo de combate. Donas-de-casa contribuíram com jóias para a campanha “Ouro para o bem de São Paulo”, a fim de financiar o esforço de guerra.

Apesar de todo o esforço, a primazia das forças governistas logo se tornou evidente nos combates travados entre julho e setembro de 1932.

No Front

A data da revolução foi marcada para o dia 14 de julho, mas os acontecimentos se precipitaram. Bertoldo Klinger, comandante militar do Mato Grosso, que garantira apoio ao movimento, foi destituído do posto e transferido para a reserva. Diante do imprevisto, os paulistas resolveram antecipar o início da insurreição. Na noite de 9 de julho de 1932, tropas da Segunda Região Militar e da Força Pública, comandadas por Isidoro Dias Lopes e Euclides Figueiredo, ocuparam pontos estratégicos da capital paulista.

O próprio interventor Pedro de Toledo foi surpreendido pela eclosão do movimento. No dia seguinte, demitiu-se da interventoria e foi aclamado governador do Estado. Dois dias depois, chegava a São Paulo Bertoldo Klinger, para assumir o comando das tropas constitucionalistas. A insurreição, porém, começou mal, não se confirmando o apoio de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul. Flores da Cunha resolveu mudar de lado, passando a reprimir os constitucionalistas gaúchos. Os mineiros, liderados por Olegário Maciel, também apoiaram Vargas.

Desencadeada a luta, o estado de São Paulo foi cercado pelas tropas federais. Na frente norte (fronteira com Minas Gerais), assumira o comando o general Góis Monteiro, com 20 mil soldados. Ao sul, o general Valdomiro Castilho de Lima, com mais 18 mil homens. Também a leste, na fronteira com o Rio de Janeiro, foram posicionadas numerosas tropas do Exército. Em julho, os rebeldes sofreram derrotas em Itararé e em Faxina. Entre agosto e setembro, os governistas tomaram várias cidades em poder dos constitucionalistas: Jundiaí e Itu, e, no vale do Paraíba, Pinheiros, Lavrinhas e outras, abandonadas pelos paulistas após muitas baixas. O porto de Santos foi bloqueado pela Marinha.

Segundo o prof. Jaziel de Paula, historiador e estudioso do assunto, a Revolução Constitucionalista, não foi só uma guerra civil, como o maior movimento armado que já se registrou em território brasileiro. O conflito assumiu em muitas ocasiões o aspecto de uma luta escarniçada e selvagem. Ódios, paixões e ideais inspiravam os dois lados a lançar mão de quaisquer recursos para abater o adversário. E o emprego da aviação militar como arma ofensiva -pela primeira vez na história do país- foi o maior dos ineditismos desta guerra. A aviação ditatorial e constitucionalista, conhecida como a “quinta arma” espalhava o pânico e terror nas trincheiras e pela retaguarda das linhas de frente. Pelo menos quatorze cidades do Estado de São Paulo foram bombardeadas pela aviação militar do exercito e marinha fieis ao governo ditatorial de Getúlio Vargas. Os ataques aéreos causaram muitos feridos, mutilados e destruição material, mas, principalmente, a indignação em famílias civis, gerando inclusive, sérios atritos diplomáticos com outros paises.

A luta foi desigual. As forças ditatoriais contavam com mais de 150 mil homens muito bem armados e municiados. Os constitucionalistas, apenas 35 mil combatentes, com minguados recursos.

Depois de quase três meses de luta, reconhecendo a derrota, o comandante da Força Pública paulista, coronel Herculano de Carvalho, firmou um acordo em separado com o general Góis Monteiro, determinando o fim do movimento, com um saldo de 633 paulistas mortos. Após a nomeação do general Valdomiro Castilho de Lima como interventor em São Paulo, dezenas de líderes constitucionalistas foram presos ou exilados.

Definições

Algumas observações do prof. Jaziel de Paula:

A guerra civil de 32 não foi uma contra-revolução de 1930. Ao contrário, visava por meio das armas, o cumprimento do programa da Aliança Liberal. Foi um movimento encabeçado pelos vencedores do movimento de 30.

Foi um movimento basicamente financiado e armado pela industria, comércio e a população de São Paulo.

Inversamente a motivações separatistas, entre suas várias singularidades, caracterizava-se como o único movimento armado de nossa história que teve como bandeira uma luta a favor de um poder constituinte nacional, ao contrário de todos os outros dirigidos contra um poder constituído.

Taubaté Revolucionária

Batalhão Jacques Felix, em frente à Igreja Santa Terezinha ainda em construção. Acervo DMPAH

Foram formados em Taubaté 5 batalhões de voluntários que entraram em combate no Vale do Paraíba.

Batalhão Jacques Felix: integrando o 4º Batalhão de Combate, sob o comando do Coronel Veiga Abreu, participou da vitória contra contingentes dos Fuzileiros Navais e Polícia Militar do Estado do Espírito Santo.

Batalhão dos Caçadores: Aquartelados no Instituto Correcional (atual Casa de Custódia)

Batalhão Arquidiocesano: que entrou em operação a partir de agosto

Batalhão Mantiqueira: formado a partir de 1º de setembro

Batalhão Auxiliar da Força Pública do Estado. Acervo DMPAH
Batalhão Auxiliar da Força Pública do Estado. Acervo DMPAH

Batalhão Auxiliar da Força Pública do Estado: Organizado a 8 de outubro e tendo como patrono o Major Paranhos Bello, segundo prefeito interventor de Taubaté.

Como o transporte das tropas de um ponto para outro era feito via férrea, funcionou na Estação Ferroviária em Taubaté a Cantina do Soldado, organizada por taubateanas, servindo refeições para soldados em trânsito na cidade.

Taubaté abrigou no edifício da antiga Câmara Municipal, a sede da Delegacia Técnica e Militar do MMDC.

Taubaté teve, pelo menos, 6 voluntários mortos em combate. Eram eles: Benedito Sergio Pinto, homenageado dando seu nome a principal rua do Bairro Estiva (Rua Voluntário Benedito Sergio), César Penna Ramos, Benedito Egidio Barbosa, Benedito Pareira, José Correa e José Eleutério dos Santos. Fotografias: Museu da Imagem e do Som de Taubaté 


Fontes pesquisadas: 
PAULA, Jaziel de: Entrevista ao jornal O Taubateano, 09/07/1999.
DONATO, Hernani: Revolução de 32, uma visão através da MPB, 1982.
CALDEIRA, Jorge: História do Brasil, Jorge Caldeira, Cia. das Letras, 1987
Fotografias: Museu da Imagem e do som de Taubaté

almanaqueurupes

1 Comment

  • MEU PAI, O CAPITÃO ARTHUR FRANZ VON HAYDIN, PROCEDENTE DA EUROPA, COMANDOU TROPAS EM ITU, ESTOU PROCURANDO MATERIA QUE O IDENTIFIQUE COMO UM DOS COMANDANTES VOLUNTARIOS POR ITU. TENHO VARIAS FOTOS. MEU PAI JÁ É FALECIDO. M,AS OBTEVE A CIDADANIA BRASILEIRA POR DECRETO FEDERAL DA ÉPOCA. GOSTARIA DE RELACIONAR PELO FACE (roberto von haydin) ou pela what`sap. HOJE RECEBI ALTA NO HOSPITAL S. LUIZ. ESTOU MEIO FRAGILIZADO PELA BAIXA IMUNIDADE QUE ESTA CEIFANDO VIDAS EM NNOSSA CAPITAL. O HOSPITAL ESTAVA LOTADO, COM A QUASE 90% DE PACIENTES COM MASCARAS. ISTO ME IMPRESSIONOU PORQUE, NO TÉRMINO DA GUERRA DE 14/18, A PANDEMIA DA GRIPE HVNI MATOU MAIS DE 40 MI8LHÕES DE PESSOAS PELO MUNDO. E AGORA OS MEDICOS QUE LUTAM PARA ELLIMINAR O VIRUSZYCA, PROCEDENTE DE TAITI, NA POLINESIA FRANCESA, JÁ ESTA ATINGINDO TODOS OS SERES HUMANOS, BASTANDO A PRESENÇA DA IMUNOLOGIA BAIXA PARA A DOENÇA DESENVOLVER. MUITO OBRIGADO PELA ATENÇÃO, ROBERTO VON HAYDIN, ADVOGADO, 84 ANOS – OAB 13.089, RUA ONOFRE SILVEIRA, 311 – VILA FACHINI – CEP 04334-100.

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