João Angelo Guimarães – Diretor de Teatro

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Almanaque Urupês: Como você define cultura?

João Ângelo Guimarães: Segundo a formulação do antropólogo britânico Edward Burnett Tylor, a cultura é “aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da sociedade”. Via, porém, a cultura humana como única, pois defendia que os diferentes povos sofreriam convergência de suas práticas culturais ao longo de seu desenvolvimento. Mais do que nunca o que ele vaticinou no final do século 19 está acontecendo agora, mas não pelos motivos que ele apontou como defensor do Evolucionismo Social.

Com o avanço tecnológico as distâncias diminuíram muito, principalmente depois do advento da rede mundial dos computadores, a comunicação por celular e o acesso universal à informação. Mas podemos afirmar que apesar das facilidades alcançadas a cultura enquanto seu aspecto transcendental perdeu muito. A globalização pasterizou os costumes e os fortes interesses econômicos dos grandes grupos de comunicação transformou a cultura em produto mercadológico, manipulando conceitos, atitudes e principalmente o pensamento social. Há mais ou menos 40 anos a cultura ainda era debatida, mostrada e aplicada por artistas que queriam discutir o sentido da vida, a aventura do espírito humano no universo. Hoje me parece que o mais importante para os artistas brasileiros é ser famoso, ter um contrato milionário com a Rede Globo de Televisão e cumprir fielmente as ordens vindas de seus chefes. Coisa impensável para um artista verdadeiro, que tem o compromisso social de discutir, debater, denunciar e provocar o “Status Quo“ e o “Establishment”.

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AU: Existe política pública cultural em Taubaté?

João Ângelo Guimarães: Não, e parece que nunca vai ter. Principalmente se depender do movimento artístico e cultural da cidade. Primeiro porque confundem difusão cultural com produção de eventos artísticos e segundo porque não existe um mercado de trabalho para os artistas locais. E a culpa é dos próprios artistas. Só para exemplificar, no mês de julho foram gastos apenas em três dias quase R$ 300 mil de verbas públicas em um único evento artístico que já foi esquecido, são gastos quase R$ 200 mil por mês em pagamentos de artistas por RPA [Recibo de Pagamento Autônomo] e a pasta da Secretaria de Cultura e Turismo tem um orçamento anual de quase R$ 10 milhões.

Com tudo isso se pode dizer que Taubaté é uma cidade cultural? Penso que não. O Teatro Metrópole fechado e caindo aos pedaços, museus que fecham aos finais de semana e com seus acervos em condições precárias, bibliotecas entregues às moscas e “showzinhos populares” que apenas repercutem os sucessos da grande mídia. Esperar que os nossos governantes pensem a cultura com suas “mentes brilhantes” é uma temeridade. Cultura é pensada por quem faz e por quem assiste e participa.

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AU: Em qual estágio de desenvolvimento está o setor de teatro em Taubaté?

João Ângelo Guimarães: Temos que fazer uma distinção nessa área. Costuma-se fazer uma grande confusão entre Arte Teatral e Performance Artística. Taubaté já teve grandes grupos teatrais com grandes espetáculos que propunham a essência do Teatro: a discussão, o debate, a crítica social e o “fazer a cabeça” como se dizia antigamente. Parece que isso tudo ficou muito “demodê” para os nossos atuais artistas cênicos. Assim pode-se afirmar sem sombra de dúvida que Taubaté vai muito bem na área da Performance e Animação Artística com seus espetáculos de Stand-up, estilo importado dos barzinhos da década de 60 do século 20 nos Estados Unidos.

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AU: Na sua avaliação, em nosso município, qual seria o modelo de política cultural mais adequada para desenvolver setor teatral?

João Ângelo Guimarães: Não existe um modelo específico de política de ação cultural. O que precisa ser entendido é que Cultura é atividade e não evento. O evento artístico é a consequência natural da atividade cultural. Nossos artistas estão preocupados em criar sistemas municipais de cultura, fundações culturais, comissões e câmaras temáticas, e como tenho visto em 36 anos, não vai levar ao que interessa: a atividade cultural. O dinheiro público não tem que ser gasto em shows pirotécnicos de artistas famosos, bancar eventos faraônicos sazonais e sim tem que ser investido em cursos, oficinas e workshops nos bairros de Teatro, Cinema e Vídeo, Literatura, Artes Plásticas, Dança Clássica, Música Clássica, construir equipamentos culturais como salas de teatro com urdimento cênico e capacidade para 900 pessoas nas quatro regiões da cidade e proporcionar aos estudantes dentro das escolas municipais o acesso às técnicas e a práxis artísticas passadas pelos próprios artistas. A atividade cultural envolve familiares, amigos e diletantes além dos artistas que a produzem. É isso que perpetua o fazer cultural e transforma as pessoas em cidadãos verdadeiros. Tudo o mais não passa de folclore.

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