Carnaval de São Luiz – “Sem rabo e sem chifre”

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Sob a ameaça de crescer chifres em suas cabeças, os foliões luisenses passaram sessenta anos sem as marchinhas, só retomadas recentemente.
Na coluna de Caíque Toledo, em fevereiro de 2015 no jornal Gazeta de Taubaté, uma breve história do carnaval de São Luiz do Paraitinga.

 

Texto de  Caíque Toledo

 

Terça-feira, dia 19 de fevereiro de 1980.

“Há sessenta anos que os doze mil habitantes de São Luis do Paraitinga, a 170 quilômetros de São Paulo, não brincam o Carnaval”.

Essa foi a abertura de uma reportagem da Rede Globo de Televisão, exibida pelo Jornal Hoje naquela tarde de fevereiro, bem no início dos naos 80. O apresentador Wellington Oliveira fazia a chamada para uma matéria da repórter Maria Christina Pinheiro. O tema era curioso. Em plena década de 80, havia em São Paulo uma cidadezinha que não comemorava a maior festa popular do Brasil. De fato, não havia Carnaval em São Luis do Paraitinga.

Padre Ignacio Gioia (acervo Odilon Bonafé no livro Respeitável público do Sertão das Cotias – chitas, flores e o carnaval de Paraitinga, de Caíque Toledo)
Padre Ignacio Gioia (acervo Odilon Bonafé no livro Respeitável público do Sertão das Cotias – chitas, flores e o carnaval de Paraitinga, de Caíque Toledo)

Mais de 60 anos antes, um padre italiano, designado pela Diocese de Taubaté para assumir a paróquia luisense, alegou que o Carnaval não era uma festa cristã. Dizia inclusive, que fiéis que participassem de eventos carnavalescos poderiam ser castigados. Os boatos contam que, em uma de suas pregações, ele chegou a dizer que nasceriam rabos e chifres em todas as pessoas que brincassem o Carnaval. Vejam só.

De volta ao início dos anos 80, a reportagem da TV Globo foi um verdadeiro marco em São Luis. Se causava tanta estranheza uma cidade que não pulava o Carnaval, por que, então, não começarmos? E foi o que aconteceu. Festival de Marchinhas, criação dos blocos, envolvimento cultural… Anos depois, São Luis do Paraitinga estaria conhecida não só pelos filhos ilustres Oswaldo Cruz e Elpídio dos Santos, mas por ter um dos principais Carnavais do Brasil.

O que diria Monsenhor Ignácio Gióia, o tal padre italiano, se visse a pequena cidadezinha tomada por quase 200 mil pessoas em cinco dias da festa que considerava profana? Se visse que o New York Times, um dos principais jornais do mundo, noticiou e exaltou a folclórica festa daquele pequeno reduto caipira em São Paulo, que ficou conhecida por todo o Brasil…

Detalhe do livro Respeitável público do Sertão das Cotias – chitas, flores e o carnaval de Paraitinga, de Caíque Toledo
Detalhe do livro Respeitável público do
Sertão das Cotias – chitas, flores e o carnaval de Paraitinga, de Caíque Toledo

Fato é que o Carnaval luisense se tornou destaque, e ano após ano apaixona foliões. Pela festa, pela cultura, pelo envolvimento do povo. O que quer que seja. E uma reportagem de televisão foi o empurrão que São Luis precisava. A ‘cidade que não brincava o Carnaval’, inconscientemente ou não, decidiu fazer história.

Sábado, 1º de março de 2014.
“Respeitável público do Sertão das Cotias. Hoje estamos aqui para convidá-los a participarem das festividades de Momo”, grita o artesão Benito Campos, em cima do caminhão e embaixo do escaldante sol luisense exatamente ao meio dia do sábado de Carnaval. Na pele do Juca Teles, o mais famoso personagem da cultura da cidade, ele avisa aos cerca de 30 mil foliões que é hora de começar a festa em São Luis.

O poeta, apenas um dos tantos na capital das marchinhas, gosta de dizer que ‘do céu, do purgatório e do inferno, ninguém escapa’. A mais pura verdade. E sabem por quê? Porque hoje é como ontem, como amanhã, ou como qualquer dia desde o início dos anos 80 naquela apaixonante cidadezinha entre um mar de morros. Porque hoje é Carnaval em São Luis do Paraitinga.

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caique2O jornalista Caíque Toledo é  e autor do livro-reportagem ‘Respeitável público do Sertão das Cotias – chitas, flores e o carnaval de Paraitinga’.

O livro está disponível para leitura online (clique aqui)

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