1878: viagem expressa por Taubaté

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Capítulo 9 sobre a passagem de D. Pedro II pelo Vale do Paraíba

Texto de Glauco Santos

No dia 11 de setembro de 1878, d. Pedro II e sua comitiva saíram de Pindamonhangaba e chegaram a Taubaté, sendo recebidos na estação da cidade. O jornal Gazeta de Taubaté (11 de agosto de 1878, p. 3) traz a notícia da chegada do monarca de forma bem diferente daquela feita quando a Princesa Isabel pisou em solo taubateano. Usando da sátira, o jornal flerta com uma fina ironia à figura intelectual do Imperador e também faz duras críticas à pompa e à ritualística empregadas na recepção do monarca, afirmando que enquanto as lavouras da região careciam de investimento, d. Pedro II e os cafeicultores da região estariam mais preocupados com os “dias de gala” que a monarquia iria oferecer na cidade. “E o que é mais notável é – que os empregados públicos são os que mais lucram com a vinda da Majestade: que o diga cá o redator da história, em?” (Gazeta de Taubaté, 11 de agosto de 1878, p. 3). O articulista continua sua sátira às tantas pompas e cerimônias preparadas pelas cidades que recepcionaram d. Pedro II na sua rápida passagem, fazendo uma pequena poesia:

“Já lá vai um dia de grande gala.

Em Lorena, a mesma cantilena!

Em Guaratinguetá…ta…ta…

Em Pindamonhangaba, o mesmo doce de goiaba.

Em Taubaté, o mesmo rapapé.

Em Caçapava… nada caçava…”

(Gazeta de Taubaté, 11 de agosto de 1878, p. 3).

A Gazeta de Taubaté. Acervo DMPAH

A agricultura não era o único ponto de discordância nas políticas públicas do Império. As questões referentes à instrução pública já se faziam latentes e eram mote principal do jornal Gazeta de Taubaté, que na edição de 18 de agosto de 1878 (p. 1) publicou em sua primeira página um apelo ao monarca que ali estaria quase um mês depois: “admitindo que S. Majestade, venha de visita a nossa província, é necessário crer que o ilustrado monarca não deixará de honrar com sua augusta presença as escolas”. O Imperador parece também ter frustrado as expectativas do redator do jornal Gazeta de Taubaté, pois tanto na breve parada que fez em Taubaté na viagem de ida para São Paulo (em 11 de setembro), quanto na volta (em 2 de outubro) não visitou nenhuma escola, nem conversou com algum professor.

Na ida para São Paulo, d. Pedro II desembarcou em Taubaté às 10h25 e foi recepcionado na estação onde “muitas girândolas estrugiram ao ar, tocando o hino nacional a Corporação musical do Illm. Snr. Professor Manoel Alves Borges” (Gazeta de Taubaté, 14 de setembro de 1878, p. 2). Após alguns vivas levantados ao monarca, a comitiva seguiu para a capital da província.

Em 2 de outubro retornaram a Taubaté, chegando às 10 horas da manhã e permanecendo por um período mais longo que na ida. Desta vez, a Câmara Municipal havia deliberado várias ações visando o embelezamento da cidade. Foram liberados até 150 mil réis para a limpeza do largo da estação, além de ter sido organizada uma comissão para recepcionar o Imperador (Ata da Câmara, 23 de setembro de 1878). Também havia sido confeccionada uma bandeira nacional, no custo de 15 mil réis, para ser hasteada na porta da Câmara, quando da visita do monarca (Ata da Câmara, 7 de outubro de 1878).

Antiga estação de Taubaté, no final do séc. XIX. Acervo DMPAH

A estação estava devidamente enfeitada com flâmulas, bandeiras e flores, além da presença do “Sr. Dr. presidente da câmara municipal, autoridades civis, clero e, numerosamente, povo em número superior a 1000 pessoas” (Gazeta de Taubaté, 6 de outubro de 1878, p. 2). Após as girândolas serem soltas, os fogos de artifício explodirem, a banda musical tocar e os vivas serem bradados, “S.S. Magestades Imperiaes seguiram para o palacete do Exmo. Sr. Dr. Moreira de Barros, onde lhes foi servido um sumptuoso almoço, tocando em sua chegada a corporação musical do professor Sr. Manoel Alves Borges” (Gazeta de Taubaté, 6 de outubro de 1878, p. 2). Após o almoço, d. Pedro II e a Imperatriz Thereza Cristina seguiram para a igreja Matriz, rezaram e voltaram para a estação, donde pegaram o trem rumo à Corte (Gazeta de Taubaté, 6 de outubro de 1878, p. 2).

Novamente o redator do Gazeta de Taubaté traz uma visão crítica de tudo o que aconteceu na cidade durante a visita do monarca. De princípio, o articulista se rende ao espetáculo ali encenado, elogiando e recepção feita a d. Pedro II: “Bonita recepção! Lá isso foi, mas mesmo muito bonita. Povo imenso, duas ricas bandas, (…) arcos; bandeiras e bandeirolas; girandolas; bombas; vivas (…). Querem mais? Vão à exposição de Paris” (Gazeta de Taubaté, 12 de outubro de 1878, p. 2). Mas, logo em seguida critica o fato de d. Pedro II não ter visitado nenhuma escola da cidade: “o fiasco primou pela ausência do monarca, que na velocidade do pensamento fez a sua viagem de recreio a nossa província” (Gazeta de Taubaté, 12 de outubro de 1878, p. 2). A rapidez da viagem também foi tema de um artigo publicado no jornal Correio Paulistano (6 de outubro de 1878, p. 2), que chegou a calcular que em apenas 22 dias, d. Pedro II e a Imperatriz percorreram cerca de 1.569 quilômetros em via-férrea, descontando as viagens feitas em tróleis e à cavalo.

Por fim, o redator do Gazeta de Taubaté fez uma análise muito perspicaz sobre a importância que todo o jogo teatral de poder da monarquia, com sua pompa e circunstância, tinha na formação da posição política de muitos cidadãos, sejam eles nobres ou não:

Não desgosto dessas manifestações, não senhores. Ao contrário, regala-me ver o povo como as cruzetas dos ventos que se movem ao menor sopro. Porem não gosto de ver o servilismo em ação quando se trata de certos, independentes e determinados caracteres que bem podiam abdicar da sem cerimônia com que se manifestam – hoje republicanos, amanhã socialistas, mais tarde liberal, conservador… etc. porque um cartório… uma barreira… até mesmo um jantar, fascina-os de tal modo que seria um crime de leso-interesse declinar do plano a que se inclinam” (Gazeta de Taubaté, 12 de outubro de 1878, p. 3).

As pompas da monarquia, mesmo ainda atingindo sua função política, pareciam encantar menos aos olhos e desagradar mais à razão dos descontentes com o regime nas cidades valeparaibanas.

________________

Referências bibliográficas

Correio Paulistano, São Paulo, 6 de outubro de 1878.

Gazeta de Taubaté, 11 de agosto de 1878.

Gazeta de Taubaté, 18 de agosto de 1878.

Gazeta de Taubaté, 14 de setembro de 1878.

Gazeta de Taubaté, 6 de outubro de 1878.

Gazeta de Taubaté, 12 de outubro de 1878.

Ata da Câmara de Taubaté, 23 de setembro de 1878.

Ata da Câmara de Taubaté, 7 de outubro de 1878.

[box style=’info’] Glauco de Souza Santos

glauco
É graduado pela Universidade de Taubaté, Mestrando em História Social pela Universidade de Campinas. Trabalha como Professor de História em São José dos Campos – SP.

 

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Veja também:

– 1878: viagem expressa por Guaratinguetá e Pindamonhangaba;

– 1878: viagem expressa pelos trilhos do trem;

– 1868: uma Princesa em Taubaté;

– As viagens de d. Pedro II ao Vale do Paraíba;

– 1868: uma Princesa devota – chegada ao Vale;

– 1868: uma Princesa devota, uma Santa e um ex-escravo;

– 1868: uma Princesa devota, uma Santa e um guarda nacional;

– 1868: um bosque para uma Princesa;

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