A figura máscula do técnico Dr. João Rachou

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Texto de Oswaldo Barbosa Guisard

Tudo o que se tem dito e escrito sobre a personalidade inconfundível de diretor e técnico que foi o dr. João Rachou na direção do Esporte Clube Taubaté – o “Sport Club Taubaté” – de então, jamais poderia ou poderá ser tido em conta de exagero, porque, pelos seus conhecimentos de futebol, pelos seus sistemas de treinamentos, pela sua fabulosa força moral junto aos jogadores e enfim por todos os atributos de capacidade com a qual conseguiu levar o “Sport” ao título cobiçado e disputado de primeiro campeão do Interior de São Paulo, de modo cristalino, indiscutível, o alviazul nos seus sessenta anos de existência jamais possuiu um dirigente orientador que o igualasse. Obteve o clube taubateano mais três campeonatos e chegou à Divisão Especial do Futebol Paulista, mas foi o dr. Rachou aquele que deixou mais assinaladas as marcas da competência, da saudade, das vitórias mais brilhantes e a persuasão do exemplo.

Mas vamos exemplificar – Dr. Rachou como treinador:

Os leitores que jogam ou já jogaram futebol enfim os que, de qualquer modo já manejaram uma bola conhecem e de modo algum ignoram uma das características de grande valia para qualquer praticante: – “Chutar razoavelmente com os dois pés”.

O jogador ambidestro leva excepcional vantagem sobre aquele que como se diz na gíria “somente tem um pé”. Este, se a bola lhe vem do lado negativo, perde tempo para ajeitá-la, deixa de aplicar muitas “viradas” e nesse caso não pode “jogar de primeira”. Pois bem: O técnico dr. João Rachou não admitia no primeiro quadro do Taubaté, jogador que não soubesse chutar com os dois pés.

À propósito um dos casos típicos a respeito desse assunto foi o “player” José Fonseca, de alcunha “Juca Jeca”, que relataremos em outra crônica.

Comparecia o famoso treinador, uma hora antes do coletivo e os jogadores treinavam atletismo, (saltos, saltos com vara, saltos de distância e de altura) corridas – batiam penalidades com a bola, escanteios, pênaltis etc. etc.

Ele mesmo apitava o treino, parando-o muitas vezes para corrigir jogadas erradas. Contudo era incapaz de se dirigir com palavras ou gestos descortêses com os jogadores. Como médico e bom psicólogo que era, fez dos seus dirigidos um grupo fraterno de amigos. E sempre foi respeitado e amado pelos seus comandados.

Não transigia com faltas injustificáveis que prejudicassem uma partida em perspectiva.

Nesse ponto era severo, irredutível. Com ele não havia no time os chamados jogadores temperamentais.

João Moura, taubateano que viera do Rio, formou com Lulú (Luiz Ladgen de Carvalho da Fonseca) a notável dupla de zagueiros de Taubaté, Lulú e Moura. Moura esteve no banco de reservas, para em caso de necessidade substituir elemento da dupla flamenguista, Pindaro e Nery, no inesquecível jogo do Campeonato Sulamericano de 1919, quando na segunda prorrogação o Brasil sagrou-se campeão num dos mais emocionantes cotejos, tendo com rival o Uruguai, dos irmãos Scarone, de Romano, de Zibecchi, Gradin e outros. Jogava o taubateano que fazia parte do São Cristóvão mais do que qualquer zagueiro; todavia como os escalados formavam uma parelha homogênea, não teve vez.

Equipe do E.C. Taubaté, campeã do jogos do interior, em 1919. Fonte: Almanaque do Tricentenário de Taubaté

Brasil1 a 0 – gol de Friedenreich.

Pois Moura deixou de comparecer a um treino do “Sport” numa “quinta-feira e os taubateanos embarcariam no rápido do dia seguinte para Ribeirão Preto afim de disputar um artístico troféu (se bem lembramos, tinha o mesmo, o nome de “Competência”).

João Moura apareceu na gare Central, preparado, pronto para seguir para a Capital do Café e veio já meio assustado falar com o dr. Rachou, procurando uma justificação para a sua falta ao treino.

– O senhor não embarca… O senhor fica em Taubaté! Ainda que sejamos derrotados!

E não houve apelo de todo o pessoal que estava na estação, que demovesse o técnico. Diretores, dona Bertha Rachou, jogadores, torcedores da massa que comparecia ao embarque, tudo inutilmente. Moura ficou.

O Taubaté empatou em Ribeirão Preto pela contagem de 2 a 2.

Era assim o dr. João Rachou!

 

[box style=’info’] Oswaldo Barbosa Guisard (1903-1982) 

Foi executivo da CTI, vereador e presidente da Câmara. Idealista, participou do grupo fundador da Semana Monteiro Lobato e por 30 anos foi seu principal divulgador, mantendo acesa a sua chama original. Batalhou com perseverança pela preservação e tombamento da Chácara do Visconde, local onde nasceu Monteiro Lobato. Sua fabulosa memória o levou a escrever o livro “Taubaté no aflorar do século, uma grande obra. [/box]

 

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