1886: o último espetáculo do Imperador no Vale do Paraíba

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Capítulo 17 sobre a passagem de D. Pedro II pelo Vale do Paraíba

Texto de Glauco Santos 

No dia 19 de outubro de 1886, d. Pedro II e a Imperatriz Thereza Cristina deixaram o hospital e dirigiram-se ao convento Santa Clara, que na época tinha como guardião o padre Francisco Cosco. Como as atividades do convento estavam paradas há tempos, o Imperador “manifestou desejo de que se fizesse ali uma colônia orfanológica, sendo assim melhor aproveitados os terrenos em vasta área e a casa de vivenda” (Correio Paulistano, 20 de outubro de 1886, p.2). Quando o Imperador chegou de volta à Corte, conseguiu de Frei João do Amor Divino, então ministro provincial da Ordem Franciscana Fluminense, a cessão do convento. Foi estipulada a data limite de 13 de janeiro de 1888 para a instalação do futuro Instituto de Agricultura, Artes e Ofício de Taubaté. A comissão fundadora do Instituto, formada pelo vigário Antônio Nascimento Castro, pelo ainda Barão de Tremembé, conselheiro Antônio Moreira de Barros e pelo capitão José Gomes Nogueira, logo se apressou. A 2 de outubro daquele ano foi fundado o Instituto Taubateano de Agricultura, Artes e Ofícios (GUISARD, 1938, p. 79). O próprio Barão, que aquela altura já era Visconde, emprestou a juro zero dez contos de réis para a fundação do Instituto que se somaram aos dois contos enviados pela Assembleia Provincial (Gazeta de Taubaté, 9 de outubro de 1887, p. 1).

Antonio de Santa Úrsula Rodovalho
Frei Antonio de Santa Úrsula Rodovalho, nascido Antônio de Melo Freitas, em Taubaté, no ano de 1762. Foi bispo eleito de Angola e confessor da bisavó de D. Pedro II, a rainha D. Maria I

Ao saber que havia na capela do Pilar um retrato antigo do frei Antônio de Santa Úrsula Rodovalho, d. Pedro II quis visitar a igreja. Chegando lá indagou aos que o acompanhavam: “’O que este homem faz aqui? Este foi um brasileiro ilustre, foi o confessor de minha avó’ – Responderam então a S. M. que a Igreja do Pilar fora construída por Timóteo Corrêa de Toledo, pai do bispo Rodovalho, ambos taubateanos” (Correio do Vale do Paraíba, 28 de dezembro de 1945, p. 5). Ao observar a pintura existente na capela do Pilar, lembrou que ela tratava-se de uma cópia da pintura original então presente no Convento de Santo Antônio do Rio de Janeiro; porém a cópia de Taubaté, datada de 1871, não agradou ao Imperador, que a achou defeituosa (Correio Paulistano, 20 de outubro de 1886, p. 2).

A comitiva então seguiu para Tremembé para visitar a igreja do Senhor Bom Jesus, a fonte da água santa e as minas de xisto betuminoso. Na igreja o Imperador e a Imperatriz rezaram. Na fonte beberam a água santa, sendo seguidos pelas pessoas que os acompanhavam. Já na mina de xisto, mineral utilizado para produção de gás para a iluminação pública, d. Pedro II ficou bem interessado pelo material e solicitou que colhessem diversos fósseis ali encontrados para que posteriormente pudesse estudá-los.

À noite, o Barão de Tremembé mandou queimar “em honra de SS. MM. um vistoso fogo de artifício, trabalho do belíssimo pirotécnico Daniel José de Camargo” (Correio do Vale do Paraíba, 28 de dezembro de 1945, p. 5). Na residência do titular foi feita uma recepção para os políticos e autoridades da cidade.

Na manhã do dia 20 de outubro, partiu a comitiva Imperial rumo à Caçapava, levando no trem o dr. Falcão Filho, o dr. Paula Toledo e o Barão de Tremembé. Em Caçapava, o Imperador desceu na estação onde foi recepcionado em alas dos alunos das escolas públicas da cidade e pelas autoridades ali presentes. “Estação adornada e repleta de povo, música, girandolas” (Correio Paulistano, 20 de outubro de 1886, p. 2).

Pela primeira vez, d. Pedro II pisava em solo da promissora cidade de São José dos Campos. A comitiva foi recebida pelos vereadores da Câmara Municipal e por outras autoridades da cidade. “Música, salvas de bombas, recepção entusiástica” (Correio Paulistano, 20 de outubro de 1886, p. 2).

Antes de saírem do Vale do Paraíba rumo à capital da província, também fizeram rápida parada na cidade de Jacareí, onde o cerimonial de recepção foi o mesmo das cidades anteriores. “O dr. juiz de direito serviu café a Suas Majestades” (Correio Paulistano, 20 de outubro de 1886, p. 2).

O antigo Teatro São João
O antigo Teatro São João


O Imperador parece ter gostado da recepção feita pelo Barão de Tremembé em Taubaté, pois um mês depois, na viagem de volta à Corte, a comitiva Imperial também pernoitou na cidade. “O trem especial chegou à cidade de Taubaté, às 4,20 da tarde, tendo SS. MM. desembarcado, pernoitando no palacete dos sr.s Barões do Tremembé, incansáveis no sentido de cercar SS. MM. de atenções merecidas e conforto possível na época” (Correio do Vale do Paraíba, 28 de dezembro de 1945, p. 5). D. Pedro II e d. Thereza Cristina jantaram e dirigiram-se ao Teatro São João a convite do Barão, assistindo a uma peça dramática em suas honras. “No entreato, uma menina de oito anos de idade, Aurora, recitou em cena aberta uma poesia alusiva aos Soberanos” (Correio do Vale do Paraíba, 28 de dezembro de 1945, p. 5). Às 8h32 da manhã do dia 19 de novembro, todas as autoridades locais, clero e grande quantidade de gente compareceram à última despedida aos monarcas.

Às 8h40 a comitiva teimou em parar em Pindamonhangaba, quando desta vez organizou uma recepção digna à importância de ilustre visita. Muitas pessoas estavam na estação à espera do Imperador, entre elas o vice-presidente da Câmara Municipal, dr. Pedro Leão Valloso e o juiz de direito da comarca, dr. Francisco Romeiro. A estação estava devidamente enfeitada e uma banda de música executava composições durante a breve parada. Semelhante ao que foi feito em Taubaté e Caçapava, duas alunas dos colégios Conceição e Andrade ofereceram buquês às Suas Majestades (Tribuna do Norte, 21 de novembro de 1886, p. 2). Os fogos de artifício e as girândolas subiram pela última vez em honra ao Imperador.

D. Pedro II, Thereza Cristina, a Princesa Isabel, o Conde d’Eu e os demais ministros e titulares do Império saíam do Vale do Paraíba paulista, deixando para trás alguns poucos nobres sinceramente cativados pelo jogo de cena das visitas Imperiais, mas um séquito de cafeicultores escravocratas insatisfeitos, que nos dias de festa levantavam vivas ao Imperador, mas ao apagar das luzes reuniam-se em clubes republicanos.

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Referências bibliográficas

Correio do Vale do Paraíba, 28 de dezembro de 1945.

Correio Paulistano, São Paulo, 20 de outubro de 1886.

Gazeta de Taubaté, 9 de outubro de 1887.

Tribuna do Norte, Pindamonhangaba, 21 de novembro de 1886.

 

GUISARD FILHO, F. Convento de Santa Clara, achegas à história de Taubaté. São Paulo: Athena Editora, 1938.

[box style=’info’] Glauco de Souza Santos

glauco
É graduado pela Universidade de Taubaté, Mestrando em História Social pela Universidade de Campinas. Trabalha como Professor de História em São José dos Campos – SP.

 

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