As festas de São João e as “Sortes”

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Em texto retirado do livro “Tempo e Memória”, Maria Thereza Marcondes relembra as tradicionais festas juninas de Taubaté

Por Maria Thereza Ramos Marcondes

Todos os anos, no dia 24 de junho, havia festa junina, na capelinha de São João [do Macuco]. Quando o padre Cardoso ou padre Chester não podia ir, o zelador da capela mandava buscar um frade do Convento de Santa Clara, em Taubaté. O pátio da capelinha era previamente enfeitado com bambu e bandeirinhas de papel de seda. Ao lado, faziam ranchinhos de sapé, cercado com taquarra , que chamavam de “botequim” e ali vendiam café, quentão, bolinho frito, doces e muitas outras coisas. Quando terminava a missa, as pessoas que haviam comungado e portanto estavam de jejum , corriam para os botequins, a fim de tomar um café bem quentinho.

Mastro de São João
Mastro de São João

A festa se constituía em missas e leilão de prendas pela manhã, e, à noite, depois da reza, havia o tradicional levantamento de mastro. O mastro era um pau do tamanho do poste da “Light”, todo pintado de cores vivas, e no topo a bandeira com o retrato do santo.

Nhô Bento, o zelador da capela, mandava armar a fogueira mais alta que uma casa. Seus filhos passavam o dia todo puxando lenha no carro de bois e a tarde a fogueira estava pronta.

Logo que terminava a reza, o padre benzia o mastro, que era levantado com grande esforço pelos homens. Neste momento estouravam muitos rojões e a fogueira já estava iluminando tudo como se fosse dia, deixando ver São João, com seu carneirinho nos braços, lá no alto do mastro. Todos os moradores do bairro levavam fogos para soltar, era um tal de “busca-pé” correndo atrás da gente que não acabava mais.

Eu era a única mulher que sabia soltar “rojão de vara”. É muito fácil, somente precisa não ter medo, para não largar antes da hora. Basta segurar o foguete longe da gente, depois de ter esfolado um pouquinho junto da vareta, para aparecer a pólvora, o que os caboclos chamavam “escorvar”  e encostar ali um tição de fogo, ou um fósforo aceso. Quando começa a sair faíscas, é preciso esperar até que ele force para sair, então é só abrir a mão que o rojão sobe. Se largarmos antes da hora, o rojão correrá pelo chão, e é muito perigoso. Ele pode estourar no meio do povo.

vela

À noite na fazenda, fazíamos  sorte tais como : comprar uma caixa de fóforo, uma vela e um espelho, tendo o cuidado de guardar tudo novo. À meia-noite em ponto, riscava-se um fósforo, acendia-se a vela e olhava-se no espelho. Aparecia o rosto do futuro marido,

Outras era assim: quebrava-se um ovo em um copo d´água e deixava-se no sereno até o dia seguinte. Logo pela manhã estaria formada pela clara do ovo, uma igreja, que significava casamento, ou então um túmulo que queria dizer que morreria solteira.

Algumas preferiam escrever diversos nomes de rapazes conhecidos, em pedacinhos de papel, que seriam enrolados e dobrados ao meio, depois colocados em um copo d´água. No dia seguinte, um pedacinho estaria aberto e nele o nome do pretendente.

Eu não achava graça nessas brincadeira. Tomei parte somente uma vez. Fiz a sorte mais fácil, que era guardar três pedacinhos de carvão sob o travesseiro e sonhar com o noivo. Sonhei com um mulato bem escuro. Acho que foi a influência do carvão. Mas não deu certo.

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Texto retirado do livro Tempo e Memória  de Maria Thereza Ramos Marcondes. Na obra, a autora relembra sua infância e juventude passadas na Fazenda de São Joaquim no bairro do Mato Dentro do Macuco , zona rural de Taubaté.

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