MONTEIRO LOBATO E O PETRÓLEO

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Os dias que antecederam a Primeira Semana Monteiro Lobato, em 1953, foram de intensa movimentação em favor do evento e do seu patrono. O principal divulgador da ideia foi o jornalista Oswaldo Barbosa Guisard, nas páginas do jornal A Tribuna.

Foi formada uma comissão nacional, composta por escritores, cientistas e artistas de todo país, com o intuito de angariar apoio do maior número possível de pessoas.

É das edições de 7 e 11 de março de 1953, pesquisadas na Hemeroteca Antonio Mello Junior, que retiramos o texto abaixo.

Observação: o texto aqui reproduzido está em sua grafia original.

tribuna7-3

MONTEIRO LOBATO E O PETRÓLEO

Paginas de ontem, valorizadas hoje

(Responsabiliza-se pelo texto o comentarista prof. Bártholo)

            No Senado Nacional agita-se a “Questão do Petroleo Nacional”. E quem o faz é um senador, muito “falante”, muito discutido, misto de “profeta”, cangaceiro, vaqueiro, jornalista “salvador da patria”, um dom Quixote.

            Esse “tudo ISSO”, esqueceu que já leu paginas de Monteiro Lobato. Esqueceu – e lhe convem esquecer – ensinamentos do grande pioneiro e profeta do nosso petroleo.

            Avizinha-se a “grande realização” taubateana da 1ª “Semana Monteiro Lobato”.

            Não poderiamos, assim silenciar, ante os debates que no Senado Federal se levantam em torno à assuntos eminentemente “lobateano”, o “profeta”, o “protomartir”, do “o petroleo é nosso”. Então, como lembrete, transcrevemos, para ser lido pelo senador, jornalista, e criador da “ordem dos vaqueiros” etc, etc., a “Mensagem de Monteiro Lobato ao povo baiano”, publicada na “A Tarde”, de Salvador, à 2 de janeiro de 1948, sob o titulo “De quem é o petroleo da Bahia?”

 

“Três anos antes da abertura do ‘poço do Lobato’ estive pela primeira vez em Salvador e vi com meus olhos, cheirei com o meu nariz e recolhi com minhas mãos uma garrafa de ‘petroleo do Lobato’. Um baiano havia descoberto esse petroleo e estava por esse tempo lutando com o governo federal, que o negava. Oscar Cordeiro abria naquele ponto cacimbas, que em bez de agua se enchiam de petroleo, e mostrava-o a todo mundo: ‘Eis o petroleo do Brasil que a gente oficial nega! Cheirem, vejam, é petroleo cru do legitimo! Abram-se perfurações aqui e este petroleo jorrará e assegurará o começo da independencia economica do Brasil!’

            Mas a malandragem federal, subornada para impedir que o Brasil jamais tivese petroleo, respondia: ‘É mentira! Esse petroleo cru veio de fora e foi posto aí de noite. Oscar Cordeiro é um caso de policia’. E os sabios federais vieram, tudo examinaram e lavraram a famosissima sentença que figura num dos numeros do ‘Boletim de Agricultura’, orgão oficial do Ministerio: Essa localidade (Lobato) do ponto de vista da geologia do petrole é positivamente desfavoravel à presença  de hidrocarbonetos (isto é, de petroleos)…. e provavam. O conjunto geotetonico (quer dizer, o lugar) é absolutamente negativo à presença de hidrocarbonetos… e provavam que era mesmo. Os elementos tecnicos do Ministerio (quer dizer a alta malandragem cientifica de lá) atestam da meneira mais formal a não existencia de jazidas de petroleo no Lobato…  e os malandros cientificos atestavam. E por fim a sentença concluia com este final escachante: Está provada, a saciedade, a não existencia de depositos petroliferos no lugar denominado Lobato, na Bahia.

            Em 1937 Fernando Costa, um caboclo de bem, vai para a pasta da Agricultura e atende, afinal, ao velho clamor de Oscar Cordeiro para que se abrisse um poço ali, ao lado das suas cacimbas de ‘petroleo cru trazido de fora’. E abre-se a perfuração, e irrompe justamente ali o primeiro poço de petroleo do Brasil, o n.o 1 do milhão de poços que o Brasil terá um dia!…

            Ficou provado que o ‘caso de policia’ não era Oscar Cordeiro, e sim aqueles insignes malandros geologicos e mineralogicos do Ministerio da Agricultura. E como por esse tempo o Brasil estava presidido por um homem honestissimo e altamente justiceiro, houve aqueles fatos que todos nós presenciamos e aplaudimos de rachar as mãos:

            – Que fatos foram? Não me lembro…

            – Que memoria fraca tens tu, Roschild Moreira! Pois não te lembras que o honestissimo Ditador mandou enforcar na praça publica os técnicos oficiais que vinham sabotando o petroleo e haviam dado aquela prodigiosa sentença sobre as possibilidades de petroleo no Lobato? Não te lembras que todos êles morreram pendur\dos e com as linguas de fóra, debaixo dos aplausos delirantes do povo carioca? E não te lembras que o honestissimo Ditador mandou fazer emissão de selos com a efigie de Oscar Cordeiro – ‘O Revelador do Petroleo no Brasil’, e erigiu-lhe um monumento de marmore e bronze ali no Lobato – na ‘localidade Lobato’ – para eterna memoria do grande feito?

            Roschild arregalou os olhos e abriu a boca. Não sabia nada disso! como andam mal informados os reporeres bahianos!…

            pois bem: eu estive na Bahia, vindo especialmente para vêr as cacimbas de petroleo de Oscar Cordeiro, três anos antes da abertura da perfuração de Lobato, da qual resultou o 1.o poço de Petroleo do Brasil.

            O 1.o poço de petroleo de um país é uma coisa tremenda. É a volta-da-chave na fechadura. É Colombo desembarcando em Guanahani. É Santos Dumont dando a volta à torre Eiffel. É Newton vendo cair a maçã. É o coronel Drake iniciando na Pennsylvania a serie do milhão de poços que determinaram a riqueza e o imenso poder dos Estados Unidos.

            O primeiro poço faz a coisa trememnda que é provar a existencia de petroleo num certo ponto. As cacimbas de Oscar Cordeiro, e depois a perfuração aberta, provavam a existencia do petroleo num certo ponto da crosta terrestre. Que ponto era esse? O Brasil, pais detentor de uma área de mais de 8 milhões de quilometros quadrados de territorio – é pois de infinitas possibilidades em petroleo.

            Tão importantes eram aquelas cacimbas de Oscar Cordeiro, que tomei no Rio um avião e fui ver. São Tomé queria provar, cheirar, sujer-se naquele caldo preto e fedorenteo, para se convencer de maneira absoluta. E levei para S. Paulo um garrafão de petroleo do Lobato.

            Agora coltei de novo. Fui vêr como meus olhos o que, em materia de petroleo, foi realizado de então para cá. E vi o campo de Candeias com algumas dezenas de poços abertos e uma avaliação de dez milhões de barris. Vi um dos poços jorrar – e fui borrifado pelo repuxo de oleo de um deles. Meu companheiro Octaviano Alves de Lima, que estava sem chapeu, teve sua calva negrejada pelo chuvilho negro. Ficou bexiguento.

            É pois uma realidade o petroleo brasileiro, por tantos anos negado e saboteado de todas as maneiras pelos altos malandros de cartola ou quepi do Rio de Janeiro federal. O engeneheiro Barroso, um sergipano sério, de poucas palavras, modelo do ‘oil-engineer’ à americana, todo operosidade e eficiencia, desdobrou diante de meus olhos o quadro do que já existe feito no Brasil em materia de petroleo. É positivamente o tranco de manivela que põe o automovem em marcha. Que o carro do petroleo brasileiro vai andar e não parará mais até à extinção dos poços, é ponto que me parece liquido. Resta resolver aquele detalhezinho muito grave de quem vai ser o petroleo do Brasil?

            Não vou tocar nesse ponto, tão debatido hoje – e embrulhado. Mas tocarei num ponto que me parece virgem: De quem é o petroleo da Bahia?”

7 de março de 1953

tribuna11-3

            O “entreguista”, Assis Chateubriand, esbanjadior de divisas em “festivais” e orgias, o riquissimo e perdulario senador, dono de truste riquissimo, pago e compensado para obter um desfibramento unico nacional, está metendo a sua “colherada” no assunto do “Petroleo”. Diz e não diz… Propõe e não propõe… o que quer é ser mesmo locupletado pela infame entrega… E quando vê uma “nuvenzinha” no horizonte, zás! Taxa de comunismo e isto é um perigo. Estamos todos a mercê de alguem que tem dinheiro, poco patriotismo e nenhum escrupulo em seara patriotica. O que quer é “atirar” a poeira demagogica nos olhos dos seus patricios, como a dizer: “quem grita mais, tenha ou não, tem razão”… Já tenho tido “pegas” com “chateubrizados” que afirmam haver sido Monteiro Lobato “comunista”. Nada disso. Há diferença entre Monteiro Lobato e comunismo. Há diferença entre um espirito forte e patriota com o “entreguismo” de Assis Chateaubriand. Este, esbanjador e perdulario de nossas divisas cambiais, lá fora e cá dentro é que cria “agitadores comunistas”. O senador está se metendo no caso do petroleo e finge ignorar a existencia de grande protomartir  do “petroleo é nosso”. Ou não leu – o que é imperdoavel – ou é um desmemoriado, por conveniencia… Leia e medite e seja honesto. O trabalho de Lobato sobre o petroleo vem enquadrar o criador da “ordem dos vaqueiros”, entre os “cartolas”, antipatrioticos entreguistas, digno do nosso vilipendio. E no discurso do “celebre entreguista” vejo longe onde ele quer chegar…. Em seus discursos, comumente encontramos isto: “se eu fôra presidente da República…” e ” se eu fosse presidente da Republica” chamo a atenção dos idealistas que lêm os discursos “entreguistas” do senador para a condicional… Isto porque revela o que pretende… E todos os meios servem a ele…

            Inda agora vem de incluir Carmelo D’Agostino entre os “Comunistas”….

            Fez mais: determinou aos jornais de seu truste jornalistico que publicassem os nomes dos deputados brasileiros que não se renderam, “antipatrioticamente”, aos “imperativos do nefando” “Convenio Militar Brasil-E.U.A.

            Serão esses bravos independentes tacados, em pouco, por esse senador entreguista, de “comunistas”… Incrivel isto.

Prof. Bartholo

11 de março de 1953

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