A passagem de Dom Pedro I pelo Vale do Paraíba

7
Share
Aqui passou por Jacareí, Taubaté, Pinda, Guará, Lorena, Areias e Bananal

A história da independência do Brasil é envolvida em uma série de discussões a respeito dos processos que a desencadearam. Usa-se como marcos as datas  8 de março de 1808 – quando a o Príncipe Regente de Portugal, D. João VI, decretou o  Rio de Janeiro como capital do reino, um processo chamado inversão metropolitana – e 26 de abril de 1821 – quando a família real retornou à Portugal deixando D. Pedro como representante do rei no Brasil. O fato é que o processo de independência do Brasil, qualquer que seja o ponto inicial, foi envolto em crises políticas tendo a metrópole como pivô[1].

O evento de 1808 foi o responsável por dar ao Brasil uma estrutura de Estado completa: livre mercado, liberdade de investimentos em indústrias, imprensa régia, agência financeira (o Banco do Brasil), casa da moeda, Supremo Tribunal, ampliação da educação técnica (medicina, direito), abertura de bibliotecas e teatros. Daquele ano até meados de 1820, a política joanina tornou o Brasil autossuficiente, ao passo que em Portugal, a população empobrecia.

D. João VI. Ilustração do Jornal do Commercio. Acervo DMPAH

A volta de D. João VI à Portugal foi uma forma de equilibrar os ânimos dos portugueses e brasileiros: os primeiros sentiam-se prejudicados com os anos de guerras contra o exército napoleônico e o governo estrangeiro instalado no país; enquanto os brasileiros sentiam-se no lucro e assim permaneceram com a decisão do rei em deixar o governo colonial nas mãos de Pedro I. Todos ganhavam com o retorno do rei, especialmente o rei, que levou quase todas as reservas de dinheiro dos cofres do Banco do Brasil e deixou um príncipe.

De disputa política à país soberano

A real intenção da viagem de D. Pedro I do Rio de Janeiro a São Paulo era obter a unidade regional da província de São Paulo, abafar a disputa política entre o Coronel Francisco Inácio de Sousa Queirós e José Bonifácio, a fim de declarar publicamente seu apoio à casa dos Andradas.

Durante a vigem, passou pelas cidades do Vale do Paraíba, onde formou sua guarda de honra. Passou por Areias, Santo Antonio da Cachoeira (Cachoeira Paulista), Vila de Nossa Senhora da Piedade de Lorena, Santo Antonio de Guaratinguetá, Capela de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Roseira Velha, Pindamonhangaba, Taubaté – onde era aguardado por moradores das vilas de São José do Paraíba, Nossa Senhora da Conceição de Jacareí -, seguiu até Jacareí e de seguiu para Penha da França (atual bairro da Penha, em São Paulo), passando antes por Mogi das Cruzes.

O Vale do Paraíba foi a única região do Brasil a participar diretamente dos acontecimentos que culminaram com a separação do Reino do Brasil do Reino de Portugal, no dia 7 de setembro de 1822, na colina do Ipiranga – ali estavam, naquela tarde histórica, os vale-paraibanos testemunhas oculares do gesto de Dom Pedro, criador do Império do Brasil. (PASIN, Jornada da Independência)

 A chegada em São Paulo foi comemorada e, lá, qualquer movimento revoltoso foi sufocado e a autoridade imperial restabelecida. Enquanto estava na capital da Província, chegou a seu conhecimento, em 7 de setembro, os despachos de Lisboa ordenando o retorno de D. Pedro I à Portugal e a prisão de José Bonifácio de Andrada. Seguindo conselho da Princesa Leopoldina, D. Pedro proclamou a independência, tornando-se Imperador e Rei do Brasil.

 

Um príncipe em Taubaté

Seguindo em viagem em terras valeparaibanas, D. Pedro chegou em Tauabaté no dia 21 de agosto. Recepcionado com fogos de artifício, entrou em uma cidade limpa, com os prédios adornados com lanternas e música: uma verdadeira festa.

Recepcionado pelo clero e os membros da alta sociedade, dirigiu-se à casa do Cônego Antônio Moreira Costa, onde se hospedou e passou por sessões de bajulações, que eram marcadas por ruidosas “descargas de pólvora”, dobrados e peças marciais pelas bandas de música[2].

Don Juan, como foi chamado pelo jornalista Guilhermo Codazzi da Costa, o príncipe teve seus momentos de prazer com uma mulata da cidade, provavelmente uma prostituta. Os pais de família, sabendo da fama do príncipe, trataram de afastar suas filhas da cidade, evitando, assim, que fossem vítimas do galanteador.

Monumento ao Centenário da Independência. Foto: Angelo Rubim

Em Taubaté, se procedente a anedota contada por Assis Cintra em “Histórias quer não vêm na História”, não teria passado despercebido ao Príncipe a ausência de “brotos”, de moças bonitas, à cerimônia do beija-mão então oferecida. É que o Vigário, prudente e zeloso, sabendo das “ousadias perigosas” do visitante, mui precavida e desveladamente, teria afastado de seus olhos “com proveitosos conselhos, as lindas ovelhinhas”.

A passagem por Taubaté foi curta, mas significativa. Na cidade fez despachos, reuniu-se com a elite e distribuiu títulos de nobreza. E foi na cidade que sua guarda de honra ganhou corpo com a incorporação de outros sete integrantes: Bento Vieira de Moura, Adriano Gomes Vieira de Almeida, Francisco Xavier Almeida, Fernando Gomes Nogueira, Rodrigo Gomes Vieira de Almeida, Vicente da Costa Braga e João José Lopes.

Sua passagem continuou sentida ao longo de toda a história posterior à viagem. A rua por onde passou, que era o trecho urbano da antiga estrada Rio-São Paulo, então chamada Rua do Gado, passou a ostentar, em 1873, o nome de Rua do Príncipe, proposto pelo vereador Francisco Xavier d’Assis Moura. Com a proclamação da República, em 1889, a rua passou a se chamar XV de Novembro.

Em 1922, no centenário da Independência, Taubaté prestou homenagem ao evento do dia 7 de setembro com a inauguração do obelisco de um obelisco no Parque Dr. Barbosa de Oliveira. Mais tarde, em 1955, o prefeito Felix Guisard Filho nomeou sete logradouros com os nomes do guardas de honra taubateanos, a outro logradouro nomeou Travessa do Ipiranga e uma das principais artérias da cidade, marginal da rodovia Pres. Dutra, deu o nome de Avenida Dom Pedro I.



E o grito do Ipiranga?

O dia da Independência é outro ponto de inflexão entre historiadores. De fato o evento todo se deu no dia 7 de setembro de 1822. Não há nenhuma evidência de que não tenha acontecido às margens do Ipiranga. No entanto, ou o grito foi suficientemente alto para que D. João VI escutasse do outro lado do oceano ou a notícia só se espalharia na velocidade dos navios da época.

Na prática, o grito chegou em Lisboa em novembro e causou muito desconforto. Imediatamente o rei português organizou um exército e enviou ao Brasil. A guerra só terminaria em 1823, com vitória brasileira e cerca de 5000 baixas. A independência de fato só aconteceria em 1825, depois do pagamento de uma pesada indenização que os brasileiros fizeram aos coferes portugueses, que se julgavam no prejuízo com a perda da lucrativa colônia e com as perdas na guerra.

Independência ou morte, de Pedro Américo. Museu Paulista

O evento retratado por Pedro Américo foi uma forma de transformar o feito em um ato heroico do ponto de vista imagético. Criando o mito do herói, Américo humanizou o Imperador e tentou fortalecer a imagem do Império (em derrocada quando a pintura foi feita).

Há uma vasta literatura que defende que o imperador, no momento do grito do Ipiranga, montava um animal de carga, em trajes pouco pomposos e com dor de barriga. Os Dragões da Independência ainda não existiam, a guarda de honra era composta de fazendeiros do Vale do Paraíba que não usavam uniformes.

O fato é que o evento aconteceu  e representa uma das datas máximas das comemorações cívicas no Brasil.

REFERÊNCIAS

COSTA, Guilhesmo Codazzi da. Na trilha da Independência, Taubaté abrigou Dom Pedro por uma noite. Disponível em: valedoparaiba.com/boletim/2010/independencia/reportagens/02.doc. Acessado em 01/09/2012

HOLANDA, Sergio Buarque de. História Geral da Civilização Brasileira – O Brasil Monárquico – Tomo II, Vol.3. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997

JUNIOR, Antônio Mello. Taubaté e seus monumentos. Editora O Taubateano, 1979. Taubaté

PASIN, José LuizA Jornada da Independência. Guaratinguetá. Vale livros. 2002.


[1] 1808 – Guerras Napoleônicas; 1821 – Revolução do Porto

[2] Antonio Mello Junior, Taubaté e seus monumentos

 

Acompanhe o Almanaque Urupês também na nossa página do facebook e twitter

Related Posts
7 Comments
Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *