Amo Taiada

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Texto de  Renato Teixeira – Publicado originalmente na edição 617 do Jornal Contato

 

Caçapava entrou em minha vida em 1965, quando fui convocado a prestar serviço militar no então 6º Regimento de Infantaria Ipiranga, glória do Exército Nacional.

A vida no quartel, para um jovem de 18 anos, tem enorme importância e com certeza será determinante em seu futuro; muito menos pela habilitação bélica e muito mais pelo convívio com a tropa.

Mais que atirar com bazucas, metralhadoras e fuzis, aprende-se efetivamente a arte de viver igualitariamente dentro de um grupo. Profundas amizades pulsando a pleno vapor, vivendo-se as primeiras tensões como aquela quando o Amorim, meu querido amigo de quartel, foi atropelado e morto numa madrugada triste.

A hierarquia e a disciplina são condições impostas que visam estabelecer uma situação de comando onde os mais preparados, aqueles que possuem realmente a vocação militar, dirigem a moçada caso uma guerra venha a acontecer e a gente precise entrar pra valer na briga.

Igreja Matriz de Caçapava (Angelo Rubim/Almanaque Urupês)
Igreja Matriz de Caçapava (Angelo Rubim/Almanaque Urupês)

Lógico que a guerra, sendo um recurso extremo, quase fica fora das expectativas quando você incorpora. Ninguém pensa que, se preciso for, teremos que apontar, sim, nossas armas para o inimigo, mostrar nosso poder de fogo e o nosso preparo para o combate. Quando fui pra Caçapava, fui sem avaliar essa possibilidade.

Se houvesse um confronto bélico contra quem quer que seja, eu teria, necessariamente, que ir pra briga.

Logo eu que sempre fui um sujeito pacato e que, mesmo tendo um quarto do meu sangue importado da Irlanda pelos primos da família Gracie, famosos pela pratica do jiu-jitsu, jamais saí na porrada com quem quer que seja… Com certeza, o glorioso 6º RI, tão determinante nos rumos da Segunda Guerra em território italiano, estaria bastante fragilizado se dependesse do meu ímpeto guerreiro.

Enquanto servia e praticava ordem unida, desmontava e montava um mosquetão com a precisão de um ninja. Também sabia me arrastar na lama com os cotovelos, abraçado à arma. Aprendi a jogar granadas. Pratiquei com uma INA, metralhadora nacional com péssima trave que, às vezes, disparava sozinha.

Mas também fiz um jornalzinho mural chamado “O Guri” que, no final do ano, ganhou o formato de uma inocente e amadora revista impressa nas gráficas do Estadão e que encheu o excêntrico coronel Sá Campelo de orgulho cívico. Aquele ano vivido em Caçapava foi inesquecível e denso.

Ainda no inicio, quando éramos obrigados a passar pelo tal período de adaptação sem voltar pra casa, me matriculei na Escola de Comércio para ver se virava contador.

Acabei virando cantador. Mas Caçapava passou a ter um lugarzinho muito especial no meu coração. Sempre que posso dou uma entradinha na graciosa cidade e não me canso de ficar encantado com sua forma compacta e confortável.

Maurílio, meu inesquecível companheiro de quartel e legítimo caçapavense, sempre que podia, ia me encontrar pra gente colocar a conversa em dia e me levava generosas quantidades de taiada, um doce que mistura rapadura com gengibre e deixa a gente eternamente escrava de seu sabor. Caçapava e Taiada são praticamente a mesma coisa…

Taiada (Felipe Rau/AE)
Taiada (Felipe Rau/AE)

Amo Caçapava, amo o 6º Regimento e adoro taiada…

 

 

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