A luta pelo cofre* da igreja em Taubaté

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A igreja Católica separa a religião do negócio que ela própria propicia, mas não conseguiu esconder a batalha travada com a arquidiocese de São Paulo quando esta colocou sob seu controle a igreja de Aparecida do Norte.

*Expressão cunhada pelo Pe. Júlio Brusto Toni

Por Paulo de Tarso (Jornal Contato)

Epaminondas Nunes de Ávila e Silva foi o primeiro bispo da diocese de Taubaté e seu bispado, que durou de 1909 a 1935, foi um período marcado por turbulências sociais, políticas e religiosas. A jovem república criada em 1889 ainda não estava consolidada. A separação
da Igreja Católica do Estado ainda era uma ferida aberta. A Igreja desde então era obrigada a zelar por sua sobrevivência material. Na outra ponta, doutrinariamente enfrentava a denominada “Reforma Ultramontana”, que visava valorizar o religioso diante da mudanças provocadas pelo desenvolvimento tecnológico que ganhava cada vez mais espaço na sociedade. D. Epaminondas é fruto desse período. Seu bispado impôs modelo burocrático tal qual a dos padres da Congregação do Santíssimo Redentor em Aparecida. Por outro lado, a capital paulista foi alçada
à condição de Arquidiocese comandada pelo taubateano arcebispo D. Duarte Leopoldo que tinha sob suas asas as recém criadas dioceses de Campinas, Botucatu, Ribeirão Preto, São Carlos do Pinhal e Taubaté. D. Epaminondas foi incumbido de enquadrar os indisciplinados padres do Império nos moldes ultramontanos – obedientes e disciplinados – em toda a região. O objetivo era controlar as práticas religiosas que envolviama massa de fiéis. Dentro desse processo, a criação de seminários exigia cuidados especiais na formação de religiosos obedientes e coesos em termo de hierarquia no gerenciamento da máquina burocrática.

Dom Epaminondas, 1º bispo de Taubaté
Dom Epaminondas, 1º bispo de Taubaté

Os cônegos Nascimento

Estudos sobre uma história ainda não contada revelam que por trás de D. Epaminondas existia uma eminência parda, cônego Nascimento Castro, irmão do cônego Valois de Castro que se destacaria na política até o advento da Segunda República sob o governo de Getúlio Vargas.
Nascimento Castro tenta por todos os meios controlar a Igreja de Aparecida porque o Santuário estava localizado no espaço geográfico da diocese de Taubaté. Porém, Aparecida ficou sob o comando direto da Arquidiocese de São Paulo, que por sua vez era controlada pelo Cardeal ArcoVerde responsável pela vinda dos padres redendoristas.

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Felix Guisard e membros da família e o monsenhor Nascimento Castro, vigário geral do bispado de taubaté, em 1919. Imagem: http://www.ibamendes.com/

Afinal, o Santuário era (e ainda é) fonte de preciosa renda. Esse fato provocou intensa disputa entre membros da própria Igreja e detentores de altos cargos na sólida hierarquia clerical. Dom Epaminondas insiste pela manutenção do controle do cofre de Aparecida por Taubaté. Desiste diante do poder do Cardeal Arco Verde. A saída encontrada foi desenvolver um plano que visava implantar em Taubaté um núcleo de fé alinhado com a doutrina ultramontana em devoção à Santa Terezinha: uma santa branca, de origem europeia em contraposição a escurinha Aparecida. O Santuário de Santa Terezinha, o primeiro do mundo construído em sua honra, fez parte de um projeto que foi uma resposta de Dom Epaminondas que, açulado pelo cônego Nascimento Castro, queria de qualquer modo controlar os cofres do Santuário de Aparecida. Os fatos mostram que essa estratégia não deu certo e que existem pistas muito concretas para se escrever uma história ainda desconhecida. Enfim, analisando o governo diocesano de D. Epaminondas, pode-se concluir que, além da atuação comum aos bispos da época, quais sejam, o controle sobre o clero, o enquadramento das irmandades leigas e a burocratização da diocese, suas ações romanizadoras, como reposta ao confronto com o arcebispo D. Duarte, focou-se na devoção a Santa Terezinha, sendo construído, em Taubaté, o primeiro santuário do mundo em sua honra.

Valois de Castro
Valois de Castro

[colored_box color=” yellow”] Fontes: Essa matéria só foi possível graças a contribuição de Isnard de Albuquerque Câmara Neto, ex-oficial do Exército Brasileiro, ex-presidente da FUST – Fundação Universitária de Taubaté e atual vice-reitor da Unitau. Recentemente ele protagonizou a polêmica que marcou a recondução do professor José Rui Camargo à reitoria da universidade. Com esse currículo, poucos conhecem sua expertise em sociologia e história da Igreja Católica. Recente reportagem veiculada pela edição 653 de CONTATO “Política e religião da República Velha”, focando a história do cônego Valois de Castro no início do século 20, reascendeu o espírito de pesquisador de Isnard. Convidado, compareceu à redação com uma cópia de sua tese intitulada “A ação romanizadora e a luta pelo cofre: D. Epaminondas, primeiro bispo de Taubaté (1909 – 1935). A conversa incluiu Pedro Rubim e resultou em mais pesquisas que embasam essa matéria. É mais dobrinha que se ergue sobre a milenar Igreja Católica que viveu, cresceu, se desenvolveu e sobreviveu ao longo de todo esse tempo. Porém, salvo algumas exceções, ainda são pouco conhecidos alguns dos métodos empregados por seus próceres. [/colored_box]

 

Veja também:

–  Cônego Valois de Castro, o deputado

– O cônego que enfureceu o Estado

– Igreja Matriz, coisa de político

– PLÍNIO A. SAMPAIO: Proposta indecorosa

 

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