Anacleto

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Por Renato Teixeira

 

Anacleto Rosas Junior nasceu em Mogi das Cruzes em 1911. Morreu em 1978, em Taubaté, cidade que ele escolheu para viver. Lembro-me dele à frente de seu programa nas madrugadas da Difusora, acordando a mulherada e dando a maior força para que fossem preparando café pros maridos que cumpriam a missão diária e sagrada de levar o leite até a cerca da propriedade. Antes do dia nascer, os caminhões da Vigor cortavam as estradinhas vicinais recolhendo o leite para levar pra usina onde seria tratado e comercializado.

Ouvi bastante Anacleto nos fins das noitadas especiais, como os tradicionais bailes do TCC. Tenho inclusive uma canção falando das “muitas vezes, junto ao fim das madrugadas, eu sentava e debruçava no balcão e ao som da sertaneja alvorada, eu batia um longo papo com o garçom” ouvindo Anacleto.

Arte de divulgação da obra de Anacleto Rosas, executado pelo estúdio Foto Castro Taubaté. Acervo MISTAU
Arte de divulgação da obra de Anacleto Rosas, executado pelo estúdio Foto Castro Taubaté. Acervo MISTAU

Outras vezes, cruzava com ele nos corredores da Difusora ou passando pela discoteca onde seu discípulo musical Theodoro Arrael escolhia as canções que a cidade deveria ouvir.

Infelizmente, não tive sensibilidade suficiente para, naquele momento, ter me aproximado dele. Eu estava completamente envolvido com a MPB e não tinha ouvidos para outras coisas. Nem os Beatles conseguiram tirar minha concentração. Nem poderia imaginar que ao meu lado, na minha cidade, trabalhando na mesma emissora que eu, estava o criador do estilo da moda campeira e um dos maiores compositores caipiras da humanidade.

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Anacleto Rosas Junior. Acervo MISTAU

“Os Três Boiadeiros” é uma obra prima; “Mestiça”, uma espécie de hino do Mato Grosso. Amo “Aparecida do Norte” quando ele diz no linguajar pleno dos caipiras “…arrumemo um caminhão, ajeitemo nossas mala”. Sem contar a magnífica “Cruz de Ferro”, contando a vingança de Gorinho, uma canção da minha infância ubatubana. Foi gravada por todos os grandes de sua geração, inclusive por Luiz Gonzaga.

Tenho uma foto do Anacleto em casa. Gosto demais das músicas dele. Suas composições são tão exatas que servem como referência para qualquer compositor que queira aprender a magia da espontaneidade. Eu particularmente acredito na inspiração irracional, aquela que pula pra fora da gente sem academicismos, como fazia um dos maiores compositores da terra, um “caipira carioca” chamado Nelson Cavaquinho.

A história de Anacleto no planeta completou cem anos e sou capaz de apostar que nem a minha querida Difusora percebeu. Talvez Luiz Rosas tenha feito alguma coisa, já que Theodoro parou de tocar viola e Creusa faleceu.

 

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Publicado originalmente na edição 592 do Jornal Contato

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