Breganha: Volta às origens

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A feira da Breganha é mais antiga do que muitas cidades brasileiras. Ela surgiu na Taubaté do século 17, conviveu com os bandeirantes que povoaram Minas Gerais, se desenvolveu no império, testemunhou a república e resistiu na sua forma original até os anos 1940.

Para o pesquisador Paulo Camilher Florençano (1913-1988), a Breganha (troca) é ‘remanescente do tempo colonial quando rareava a moeda circulante e a troca de mercadoria (escambo) surgia como solução prática. Sua continuidade provém do fato de ser um processo econômico muito jeitoso e cômodo, principalmente para o homem rural, que até há pouco tempo, representava a força de freqüência na Breganha’.

Há exatos 65 anos, segundo Gentil de Camargo (1900-1983), Taubaté vivenciava uma modernização urbana difundindo na paisagem seu aspecto de ‘feiúra gritante’, período em casarões eram demolidos e os arranha-céus começaram a esconder aSerra da Mantiqueira.
‘Isto, porém, é a expressão tangível do que vai pela alma da cidade. A paisagem cultural mancha também de manchas perniciosas, que tudo invadem, sujam, escondem’. A descaracterização da Feira da Breganha era uma das faces mais visíveis desse processo.
Segundo a historiadora Maria Morgado de Abreu (1919-2008), nos primeiros tempos, as breganhas se realizavam todas as noites na praça Dom Epaminondas.

Nos domingos, pela manhã, os breganhistas se agrupavam perto do Mercado Municipal e os relógios tornaram-se o centro de interesse dos negócios. Com o tempo, a Breganha cresceu em fama e extensão até que não coube mais no cantinho primitivo, mudando-se para a parte lateral do Mercado Municipal, ao lado do Largo de Santana e, posteriormente para a praça Doutora Paula de Toledo atrás do Mercado Municipal (fato que se deu espontaneamente), onde os interessados passaram a se reunir somente nas manhãs dominicais.

Segundo o historiador Bernardo Ortiz, a Breganha ‘perdeu gradativamente seu caráter de comércio de troca e sofreu sucessivas distorções até transformar-se, já pelos últimos anos da década de 1960, num grande centro de receptação’. A prefeitura, pressionada por intelectuais taubateanos, editou o decreto municipal de 1968, que criou oficialmente o Pátio da Breganha, proibindo a instalação de ‘marreteiros, camelôs, vendedores de artigos manufaturados, barracas e qualquer outro tipo de comércio capaz de deturpar sua origem e feição’.

Infelizmente, o decreto foi perdendo efeito ao longo do tempo. Como bem observa Angelo Rubim, a descaracterização final da Breganha tem forte relação com a inauguração da Ponte da Amizade, unindo a cidade brasileira de Foz do Iguaçú e a paraguaia Ciudad del Este. Na década de 1970, a cidade paraguaia tornou-se um dos maiores centros comerciais do mundo especializando-se na distribuição de bugigangas e falsificações produzidas na China. Os preços baixíssimos das mercadorias atraíram sacoleiros que derramaram produtos ‘paraguaios’ nas cidades brasileiras.
No ambiente de organização espontânea da Feira da Breganha, o comércio de muambas encontrou as condições perfeitas para prosperar. ‘Ninguém vendia coisa nova, naqueles tempos, aí começou a haver esse negócio de Paraguai, e isso que alastrou’, confirma José Benedito da Silva, o famoso Zé Baiano da Breganha, em depoimento ao Museu da Pessoa em 2003. De lá para cá a coisa degringolou de vez. A Breganha, que desde o século 17, se desenvolveu sob um caráter mutativo, se recriando e adaptando-se as mudanças efetuadas no meio social, hoje encontra-se em coma profundo. A pirataria e o contrabando a envenenaram.

Como recuperá-la? Fazer valer o decreto de 1968 e a lei nº 55 de 1994, que dispõe, entre outras coisas, da preservação do patrimônio histórico, e aí está incluída a Feira da Breganha. E, principalmente, confiar no que dizem os breganheiros autênticos e nos estudos dos nossos historiadores, principalmente os que subsidiam este texto.

 

[box style=’info’] Texto publicado originalmente no jornal Gazeta de Taubaté  – http://gazetadetaubate.com.br/pedro-rubim-breganha-volta-as-origens/ [/box]

 

 

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